v. 43 n. 2 (2023): A paisagem e suas construções literárias
Regina Célia dos Santos Alves (UEL) e André Pinheiro (UFPI), orgs.
Há algumas décadas, desde pelo menos os anos 70 do século passado, a paisagem tem ganhado força de discussão em várias áreas do conhecimento, num processo de reavaliação do conceito e de seu alcance. As abordagens contemporâneas da paisagem coincidem em um ponto central, o do distanciamento de sua compreensão simplesmente como sinônimo de natureza ou de um dado espaço material captado pela visão. Partindo de uma perspectiva fenomenológica, as reflexões atuais em torno da paisagem apontam para o seu aspecto cultural, na medida em que colocam o sujeito como condição de sua existência. Nessa formulação, a paisagem revela-se como um complexo indissociável entre um lugar, uma percepção e uma imagem, capaz de expressar um pensamento e um conhecimento atrelados a uma perspectiva relacional, a por em xeque o paradigma dualista do conhecimento que tem se sustentado no mundo moderno ocidental, que se quer neutro, geométrico, mecânico e quantitativo, como bem afirma Augustin Berque em El pensamiento paisajero (2009). Na sua forma movente e intercambiante, trajetiva, apartada de dualismos, a paisagem constitui-se “como uma manifestação exemplar da multiplicidade dos fenômenos humanos e sociais” (Collot 2013: 15), um “espaço vivido”, da experiência, portanto, que a literatura tem explorado das mais variadas formas no decorrer do tempo.