Chamada de Artigos (CFP 2025.2): “Processos identitários na literatura afro-brasileira: problemáticas e engajamentos”

2024-07-03

Esse dossiê da Terra Roxa e Outras Terras (v. 45 n.2) tem publicação prevista para dezembro de 2025, com chamada aberta até 28 de março de 2025.

1859 é o ano que marca o início de uma profunda transformação na historiografia literária brasileira, pois Maria Firmina dos Reis e Luiz Gama publicaram aqueles que a crítica especializada considera os primeiros textos literários abolicionistas, o romance Úrsula e o livro de poemas Primeiras trovas burlescas de Getulino. Desde então, outras escritoras e outros escritores negros produziram suas obras, inicialmente de maneira isolada, depois enquanto grupo organizado, a exemplo do TEN (Teatro Experimental do Negro), fundado por Abdias Nascimento em 1944, e da publicação coletiva dos Cadernos Negros, do grupo Quilombhoje, iniciada em 1978. Resistindo ao racismo que impera no mercado editorial, no cânone e na crítica literária brasileiros, a produção marcada por uma estética negra foi, aos poucos, ganhando forma, estrutura, pensamento e ousadia, subvertendo poéticas.
Dos marcos destacados às premiações recebidas por autoras e autores negros - o prêmio Casa das Américas (2007) para Um defeito de cor, de Ana Maria Gonçalves; o Jabuti de 2015 e de 2020 para Olhos d'´água, de Conceição Evaristo, e Torto Arado, de Itamar Vieira Júnior, respectivamente - observamos a consolidação da literatura de autoria negra no Brasil, que reflete um movimento contínuo de afirmação e valorização das vozes negras na literatura. Eduardo de Assis Duarte e Cuti, importantes críticos e teóricos, discutem a relevância dessa literatura, destacando sua contribuição para a formação de uma identidade cultural brasileira plural e inclusiva. Duarte utiliza o termo "literatura afro-brasileira" para enfatizar a conexão histórica e cultural com a África, enquanto Cuti prefere "literatura negro-brasileira" para sublinhar a experiência negra no Brasil.
O crescimento dessas produções, juntamente com leis como a 10.639/03, que obriga o ensino de história e cultura africana e afro-brasileira nas escolas, e a 12.711/12, conhecida como lei das cotas, impulsionou a inserção em outros espaços de legitimação da literatura - a educação básica, superior, crítica acadêmica, mercado editorial, feiras, festivais literários, mídias, entre outros – e a crítica acadêmica especializou-se nas vertentes específicas dessas publicações: produção das mulheres negras, infantojuvenil e LGBTQIAPN+, reconhecendo a riqueza e a diversidade dessas vozes e contribuindo para sua maior visibilidade e impacto na sociedade.
A expansão da literatura de autoria negra e sua inserção nos espaços destacados provocaram polêmicas em torno de obras censuradas, como ocorreu, recentemente, com as obras Olhos d'´água, de Conceição Evaristo (2014), O avesso da pele, de Jeferson Tenório (2020), e Amoras, de Emicida (2018).
Essas polêmicas também serviram para aumentar a visibilidade dessas obras e chamar a atenção para a necessidade de políticas públicas que garantam a inclusão e a valorização da literatura negra, nos currículos escolares e nos espaços culturais. A luta contra a censura dessas obras é, portanto, parte de um movimento mais amplo de resistência contra o racismo e a discriminação, e de promoção de uma sociedade mais plural e inclusiva.
Reflexões crítico-teóricas estão centradas em conceitos, por exemplo, como feminismo negro, pós-colonialidade, identidade, de(s)colonialidade, resistência, religiosidades de matrizes africanas, interseccionalidade, letramento negro, masculinidade negra, representatividade, empoderamento e diáspora africana. Além desses, há conceitos formulados para análise dessa produção a partir de pensadoras brasileiras, como “escrevivência”, de Conceição Evaristo e “pretoguês”, de Lélia González, o que demonstra a maior visibilidade de estudiosos(as) negros(as) brasileiros(as). Outros nomes podem ser destacados: Neusa Souza Santos, Sueli Carneiro, Djamila Ribeiro, Beatriz Nascimento, Leda Maria Martins, Nilma Lino Gomes, Kabengele Munanga, entre outros e outras.
Dessa forma, este dossiê convida pesquisadoras e pesquisadores a enviarem suas produções analíticas, críticas e teóricas com foco na literatura afro-brasileira ou negro-brasileira, em suas variadas abordagens. Sugerimos algumas linhas reflexivas, sem a pretensão de limitar as análises:

a) A escrita de mulheres negras.
b) Autoria negra e temática da cultura afro-brasileira na literatura infantil e juvenil.
c) Literatura afro-brasileira e a Lei 10.639/2003.
d) As religiosidades de matrizes africanas na produção afro-brasileira.
e) Produção e crítica da dramaturgia negra.
f) Interseccionalidade e identidade na literatura negro-brasileira.
g) Narrativas da diáspora africana na literatura brasileira.
h) Representatividade e empoderamento na literatura afro-brasileira contemporânea.
i) Afrofuturismo e as produções brasileiras

Essas sugestões visam incentivar uma ampla gama de pesquisas que possam explorar a profundidade e a riqueza da literatura afro-brasileira ou negro-brasileira, contribuindo para o avanço do conhecimento e para a promoção de uma maior visibilidade e valorização dessas produções literárias.

Editoras responsáveis pelo dossiê:
Amanda Crispim Ferreira (UTFPR Campus Curitiba)
Maria Carolina de Godoy (UEL)
Nelci Alves Coelho Silvestre (UEM)

Observação: o processo de avaliação só começará a partir da data de fechamento da chamada.