v. 13 n. 26 (2018): A oralidade e seus métodos de pesquisa

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“Vem por aqui”- dizem-me alguns com olhos doces, Estendendo-me os braços, e seguros De que seria bom que eu os ouvisse Quando me dizem: “vem por aqui”! Eu olho-os com olhos lassos, (Há, nos meus olhos, ironias e cansaços) E cruzo os braços, E nunca vou por ali…  (José Régio)

Passando a considerar a invenção, elaboração e utilização de teorias incompatíveis não apenas com outras teorias, mas, ainda, com experimentos, com fatos e observações, podemos começar assinalando que nenhuma teoria está jamais em concordância com todos os fatos conhecidos em seu domínio. E a dificuldade não brota de afirmações sem base, nem é resultado de um procedimento sem rigor. Prende-se a experimentos e medidas da maior precisão e dignos de todo crédito. (Paul Feyerabend)

Métodos sempre foram a “pedra no sapato” de pesquisadores de todas as áreas do conhecimento. “Pedras nos sapatos” porque se acredita, não sem razão de certo modo, que são eles que definem e configuram o padrão de legitimidade, pertinência, cientificidade, academicidade e competência das pesquisas. Da “conjuntura que deflagraria a modernidade”, no século XVII, “empirismo e racionalismo”, “esteios da moderna concepção de método”, o “problema, a partir de então, ganha tal relevo que chega a extrapolar sua condição inicial de simples ferramenta para a atividade filosófica e científica, ganhando importância intrínseca, a ponto de tornar-se objeto de uma disciplina, a metodologia” (SOUZA, 2014). Sem método os resultados são duvidosos, inexatos, não científicos e, pior, sem comprovação e sem estatuto de “conhecimento válido”. Óbvio é que métodos e teorias implicam diretamente com a “ontologia”, “existência” e circulação dos objetos. Já vai um pouco longe, pelo bem, o tempo em que os pesquisadores em literatura oral, oralidade, culturas populares viam-se às voltas com justificativas e mais justificativas para seus objetos e estudos nos variados Programas de Pós-graduação. Principalmente aqueles pesquisadores e pesquisadoras que não eram oriundos da Antropologia, Sociologia, Historia. Era preciso provar seus estatutos “científico” e acadêmico e sua legitimidade como arte e/ou conhecimento válido. O que surgiu de bom dessa necessidade de justificativa é que investindo em métodos de outras áreas, adaptando-os, reinventando-os e redimensionando-os – ou mesmo buscando novas possibilidades – os estudos em culturas populares e literaturas orais inseriram-se, com certa antecedência de outros campos do conhecimento, nos estudos interdisciplinares. Entretanto, o Grupo de Trabalho (GT) em Literatura Oral e Popular, da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação (ANPOLL), criado em 1985, sempre teve em sua pauta e preocupação essas discussões, pois de maneira geral a interdisciplinaridade não resolve exatamente as questões dos métodos possíveis de serem utilizados para “melhor” interpretar e analisar “nossos” objetos. Não se trata, é preciso enfatizar, de encontrar “O Método”, “Um Método” para nos uniformizar, congelar, engessar. Não. Vale lembrar que ao longo do tempo, de 1985 para cá, o repertório de pesquisa dentro e fora do GT variou e ampliou-se muito. Aos estudos, dos mais diversos, das culturas populares, consideradas mais “tradicionais”, com menos contato com o universo das letras, somaram-se estudos sobre as poéticas de vozes de vanguardas, de vozes multimídias, de vozes intermediárias entre rural e urbano e tantos outros. A proposta desse número 26 da Revista Boitatá é exatamente traçar um contorno das possibilidades e experiências metodológicas que já se articularam em nossas pesquisas e de forma transdisciplinar no que concerne à teoria como característica mais ampla dos Estudos Literários de “importar” teorias “de outras áreas” para seus usos básicos ao longo desses anos e também pautar no horizonte da Área, Áreas, o que tem descortinado, descortinando, como novas experiências metodológicas. 

REFERÊNCIA:

SOUZA, Roberto Acízelo de. Letras de Hoje, Porto Alegre, v. 49, n. 4, p. 471-476, out.-dez. 2014.

Publicado: 2018-12-15

Edição completa

Editorial

Dossiê

  • Na trama narrativa, os laços da vaqueirice: a voz que conta entrelaçada aos saberes no campo do trabalho

    Délcia Pereira Pombo, Josebel Akel Fares, Fátima Cristina da Costa Pessoa
    12 - 24
    DOI: https://doi.org/10.5433/boitata.2018v13.e38522
  • O estudo das tradições orais vivas: procedimentos metodológicos em diferentes experiências vivenciadas

    Maria Ignez Novais Ayala
    25 - 35
    DOI: https://doi.org/10.5433/boitata.2018v13.e35717
  • Oralidades corporificadas: pensando o ensino de danças

    Rodrigo Lemos Soares
    36 - 45
    DOI: https://doi.org/10.5433/boitata.2018v13.e35733
  • Sujeitas(os) de conhecimento, nossas teorias, nossa violência epistêmica

    Alcione Correa Alves
    46 - 57
    DOI: https://doi.org/10.5433/boitata.2018v13.e38182

Seção Livre

  • A performance da defesa técnica no tribunal do júri

    Alexandre Ranieri, Fernando Pessoa, Larissa Melo
    59 - 66
    DOI: https://doi.org/10.5433/boitata.2018v13.e35809
  • As tramas do mito da b(ô)ta nos (des)caminhos do romance Marajó, de Dalcídio Jurandir

    Haelton Antônio Serrão de Carvalho, Josebel Akel Fares, Robervânia de Lima Sá Silva, Zaline do Carmo dos Santos Wanzeler
    67 - 77
    DOI: https://doi.org/10.5433/boitata.2018v13.e35740
  • Literatura e cinema: as funções narrativas de Propp em duas do conta A bela adormecida e suas implicações para o contexto escolar

    Robervânia de Lima Sá Silva, Érica de Cássia Mai, Zaline do Carmo dos Santos Wanzeler
    78 - 87
    DOI: https://doi.org/10.5433/boitata.2018v13.e35744
  • Memória e identidade social na música caipira da paulistânia

    Geise Bernadelli
    88 - 97
    DOI: https://doi.org/10.5433/boitata.2018v13.e35742
  • Nos (des)caminhos da literatura indígena no Rio Grande do Sul: narrativas e narradores guaranis contemporâneos

    Daniela Gebelucha, Walmir Pereira
    98 - 107
    DOI: https://doi.org/10.5433/boitata.2018v13.e35706
  • “Vaqueiros”: entre letra, voz, relações de gênero

    Fabíula Martins Ramalho, André Luís Gomes
    108 - 117
    DOI: https://doi.org/10.5433/boitata.2018v13.e35754