O Saci centenrio: uma anlise mitocrtica de Saci Perer – resultado de um inqurito

 

 

The 100-year-old Saci: a mythocrytic analyses on Saci Perer – result of an inquiry

 

 

Andriolli Costa[15]

https://orcid.org/0000-0002-8589-27

 

 

Resumo: Este trabalho revisita o livro O Saci Perer – Resultado de um Inqurito, organizado por Monteiro Lobato em 1918. O Inqurito conta com mais de 70 depoimentos que do a ver verses plurais do mais brasileiro dos mitos: o saci – duende negro, com herana europeia e indgena. Partindo do levantamento da Narrativa Cannica e do reconhecimento do lastro simblico do Nome do mito, o trabalho d incio a uma anlise mitocrtica fundamentada na vertente arquetipolgica da Teoria Geral do Imaginrio, buscando evidenciar as constelaes simblicas que emergem da obra. Tensionando leituras de que o texto evocaria imagens racistas e demonizadas, a partir da anlise encontramos agrupamentos referentes aos mitologemas do Indgena, do Pssaro, do Escravo, do Transgressor, do Demnio e do Heri, que evidenciam uma complexidade inata no mito enquanto aquele que hesita entre aliado e castigador, entre aparentado do diabo e eleito de Deus, entre desvio mantenedor do status quo e inspirao para a liberdade.

Palavras-chave: Saci; Imaginrio; Folclore; Mito; Monteiro Lobato.

 

Abstract: This article revisits the book O Saci Pererresulto of an inquiry, organized by Monteiro Lobato in 1918. The Inquiry counts on more than 70 testimonials that gives us plural versions of the most Brazilian of the myths; the saci - a black and legless imp with a red cap inherited from the European gnomes and with indigenous origin. Starting with the identification of the Canonical Narrative and the recognition of the symbolic coverage of the Name of the myth, this works develops a mythocritic analysis based on the archetypological aspect of the General Theory of the Imaginary, seeking to highlight the symbolic constellations that emerge from the ouvre. Tensioning readings that the text would evoke racist and demonized images, through the analysis weve found the following mythologems: the Indigenous, the Bird, the Slave, the Transgressor, the Demon and the Hero, which show an innate complexity in the myth as that who hesitates between ally and punisher, between the devil and the elect of God, between the deviation used to maintain the status quo and the inspiration for freedom.

Keywords: Saci; Imaginary; Folklore; Myth;  Monteiro; Lobato.

 

 

Introduo

 

O ano era 1917 quando Monteiro Lobato usou das pginas que dispunha no Estadinho, suplemento do jornal O Estado de S. Paulo, para fazer uma convocatria. O escritor j ganhara notoriedade anos antes com a publicao de artigos que consolidavam a imagem do caipira enquanto um parasita da terra e eptome do atraso, seja devido a prticas de cultivo antiquadas (como a coivara), pela suposta preguia ou pelo modo de vida pacato. Afeito a polmicas e sempre de dedo em riste, entretanto, Lobato retornava desta vez temtica interiorana para encontrar nela no mais o bode expiatrio da conjuntura brasileira, mas sua panaceia. Buscava, para tanto, realizar um inqurito. Sobre o futuro presidente da Repblica? No. Sobre o saci (LOBATO, 2008, p. 36). Ambos, a obra e o mito que a inspirou, sero objeto deste estudo.

Muitos compreendem a campanha lobatiana, que trouxe o duende perneta como estandarte, mero reflexo de seus arroubos nacionalistas. E h motivos para isso. No mais puro deboche, o autor dedica o Inqurito, por um lado, saudosa Tia Esmria e a todas as pretas velhas contadoras de histrias; por outro, ao bairro do Trianon, regio que elegeu como substrato da goma europeia na capital paulista. No mesmo perodo, o autor j se demonstrava desgostoso com o estrangeirismo que invadia o Brasil nos modos, no vocabulrio, e especialmente na arte. Revolta-se especialmente com esttuas de duendes barbaudos, encapotados para o frio sob o sol tupiniquim – reflexo do que julgava ser uma covarde esttica nacional. Para Lobato, deveramos assumir nossos motivos, com imagens no de anes nibelungos, mas de curupiras, papagaios, macacos ou, claro, de sacis (LOBATO, 2008, p. 29).

Seria uma incorreo, entretanto, limitar o lanamento do Inqurito busca pela valorizao do nacional – especialmente tendo em vista a pesada crtica lobatiana ao caipira e sua admirao modernidade, indstria e aos Estados Unidos. O que a explica, portanto? Uma resposta possvel pode ser encontrada nas razes simblicas do imaginrio. de se lembrar que estvamos no pice da Grande Guerra, a primeira at ento. As promessas de progresso permanente da tecnologia, que nos levaria ao apogeu da evoluo humana, se concretizavam em forma de carnificina. O mito de Prometeu, que trazia as promessas do fogo e da Tcnica para o homem, se convertia na desumanidade fustica daquele que perdeu sua alma na busca pelo sucesso (DURAND, 1998, p. 256).

Essa relao de descrdito momentneo com o progresso maquinstico est manifesta na abertura do Inqurito, j publicado na forma de livro. Nela, percebemos que, brutalidade cometida pelas naes ditas civilizadas, Lobato buscou um contraponto no saci e em tudo o que derivava a partir dele (o interior, a natureza, a pilhria e, claro, a liberdade).

Quem se afoutasse a abrir uma folha sorvia sangue dos telegramas seo livre. Um engulho. Foi quando surgiu o Saci, e veio com suas diabruras aliviar-nos do pesadelo. Por vrias semanas alvorotaste meio mundo, oh infernal maroto, e desviaste a nossa ateno para quadro mais ameno que o trucidar dos povos. Bendito sejas! Ests perdoado de muitas travessuras por haveres interrompido, por um momento, em nossa imaginao, a hedionda sesso permanente de horror, aberta pelo sinistro 2 de agosto de 1914, de execrabilssima memria (LOBATO, 2008, p. 27).

No total, foram mais de 70 depoimentos recebidos para o projeto que se tornaria publicao. Certas cartas traziam um incontido deboche, outras poucas uma crena velada. A maioria recordava com nostalgia as lembranas da meninice encantada pelas histrias do mito. O mtodo do Inqurito coletivo, diferente do ensaio individual, favoreceu a pluralidade de imagens. Por certo que h um recorte de classe imediato entre os informantes – no mnimo na questo da alfabetizao, j que os relatos foram enviados por escrito – s que ainda assim abre-se espao para imagens que independem da viso de mundo de um nico autor. Assim, por certo que o racismo e a eugenia manifestam abertamente nas correspondncias de Lobato e de modo latente na sua fico (HABIB, 2003) no devem ser ignorados. No entanto, a fora simblica que d forma ao saci antecede e muito as elocubraes do autor sobre raa.

Neste trabalho, filiado Teoria Geral do Imaginrio, revisitamos Saci Perer – Resultado de um Inqurito pouco aps o centenrio de sua publicao para buscar na obra cultural as respostas que apenas a mitocrtica pode oferecer: quais imagens simblicas constelam a partir do saci no Inqurito? Como elas so dinamizadas por uma sociedade marcadamente racista e que saa h apenas trs dcadas da abolio da escravatura? E, acima de tudo, possvel a partir da obra compreender o porqu, mesmo um sculo depois, o saci permanece sendo um dos mais mitos mais famosos do pas?

A mitodologia durandiana, como ele mesmo a batiza, se centra no estudo do mito enquanto imaginrio manifesto e busca analisar as redundncias da imagem em uma obra cultural, que se repete para melhor impregnar e persuadir (DURAND, 1998). Compreendendo o mito como a narrativa, o mitologema como seu esqueleto e os mitemas como as menores partes narrativas que constituem o mito (DURAND, 2012), o percurso consiste em identificar e organizar os mitologemas e mitemas para a partir deles orientar a anlise. Assim, perseguiremos a presa mtica no texto do Inqurito para tirar suas consequncias em uma anlise que, embora no ignore as controvrsias envolvendo a biografia do autor, a tensione para encontrar no prprio texto seus sentidos epifnicos.

 

 

O Inqurito

 

J consolidado na imprensa paulista, com quem colaborava frequentemente com artigos provocantes que movimentavam a audincia, Lobato passou a insistir na temtica do saci em um artigo publicado no dia 24 de janeiro de 1917. O gancho para o assunto foi trazido por um companheiro de redao: Manuel Lopes de Oliveira Filho, o Manequinho Lopes. O bilogo, hoje considerado pai do Parque Ibirapuera, era tambm articulista do jornal e, segundo Lobato, um grande investigador da lngua Tupi e das culturas populares. Lopes buscou plasmar a figura do duende brasileiro em barro do Po[16], oferecendo o motivo perfeito para o texto lobatiano: a falta de representaes artsticas dos mitos brasileiros.

 

Figura 1 – Saci de Manequinho Lopes

Fonte: ESTADO, 1917, p. 4.

 

Se o medo e a escurido, reflete Lobato, foram capazes de gerar tanto os deuses gregos imortalizados pelos aedos quanto a corte das fadas em sonhos preservados pela dramaturgia de Shakespeare; no Brasil, que em nada lhes devia no quesito da fantstica popular, faltava ainda o envolvimento dos artistas para abraar de vez essa cultura. No apenas por desinteresse, mas por falta de acesso. Afinal, justifica o autor, se era comum encontrar tomos dos mais variados dedicados mitologia celta nas bibliotecas pblicas, o mesmo no pode ser dito dos livros sobre nosso folclore que raramente conspurcavam o nobre ambiente livresco. Para manter a honestidade do registro, Lobato recomendava ir ao povo. Afundar na roa para uma consulta ao grande livro no escrito da crendice popular (LOBATO, 2008, p. 32).

Talvez aos olhos de hoje a assertiva de Lobato possa parecer banal. No entanto, preciso lembrar que na poca, especialmente nos peridicos dominados por uma elite intelectual altamente excludente, tudo aquilo ligado ao folclrico era abordado pela perspectiva do extico, pouco mais que um folhetim de curiosidades. Basta ver, por exemplo, aquele que considerado um dos primeiros artigos de jornal no qual o mito do Saci Perer mencionado. Publicado em 1859 no Correio Paulistano, o texto j se coloca na defensiva, justificando-se o tempo todo. O pedido de desculpas ao mesmo tempo em que apascenta o pblico, menospreza de incio todo o contedo das narrativas que investiga

Respeitvel leitor, venervel crtico de testa enrugada e olhar inspirado, no vos revoltais contra as histrias populares que vou comear a escrever. So crenas errneas e muitas vezes cmicas as do povo, mas nem por isso destitudas de interesse; recreiam a imaginao, acalmam por vezes os cuidados do esprito e so para muitos recordao doce do passado (CORREIO PAULISTANO, 1859, p. 2).

Se o Correio j antecipava crticas, Lobato no esperava menos polmica quando trouxe a temtica ao Estado meio sculo depois. E se alguns leitores se mostraram ultrajados com um jornal srio gastar tinta e papel com to grosseira superstio popular, dessas que depe contra os nossos crditos de civilizados perante as naes estrangeiras (LOBATO, 2008, p. 35), muitos outros se envolveram com a narrativa j nostlgica. O interesse havia sido despertado.

Lobato (2008, p. 37) encontrou no Perer – tido por ele como a mais original de nossas criaes populares – o protagonista perfeito para sua campanha. Encantado resultante do imaginrio do indgena, do negro e do europeu, defendia Lobato, o saci era a sntese da cultura brasileira. O mito, explica ele, vem do autctone que lhe deu o nome atual, corruptela de aa cy perereg[17]. Sofreu o influxo do africano, passando de caboclinho a molecote. Modificou-se por injuno da psquica portuguesa. O mestio meteu nele muita coisa de seu (LOBATO, 2008, p. 38). Estudar o saci, desta forma, era estudar o Brasil

O inqurito se consolidou a partir de cartas dos leitores que deveriam responder a uma trinca de perguntas orientadoras.

 

a) Sobre a sua concepo pessoal do Saci; como a recebeu na sua infncia; de quem a recebeu; que papel representou tal crendice na sua vida, etc.;

b) Qual a forma atual da crendice na zona em que reside;

c) Que histrias e casos interessantes, passados ou ouvidos sabe a respeito do Saci.

 

Nem todos se valeram deste expediente, chegando a enviar msicas, poemas ou relatos de memria – em histrias escutadas na infncia pela voz de mucamas, amas de leite, ex-escravos ou funcionrios da fazenda. Outros abraaram o empreendimento e foram a campo conversar com caboclos, boiadeiros, parentes mais velhos. Retratos de distino de classes entre quem contava e quem ouvia, por um lado, mas por outro um resumo da dinmica do folclore – transmitido pela oralidade, mas fixado por lastros simblicos ainda mais poderosos mobilizados pelo imaginrio.

A participao foi considervel e gerou um livro publicado em 1918. No total, a publicao contou com 73 depoimentos, incluindo um assinado pelo prprio Saci e redigido por Lobato. O grosso das correspondncias vinha de So Paulo e interior, mas tambm houve depoimentos enviados do Rio de Janeiro, Minas Gerais e Bahia. Outros, em seus relatos, mencionavam tambm os estados de Gois, Mato Grosso e Paran, e um leitor, de maneira ampla, a regio Nordeste. Uma amostragem concentrada – focada nos leitores do jornal paulista – mas que j demonstrava a fora do mito pelo territrio nacional.

O envolvimento do pblico no foi obra do acaso. O saci movimenta emoes que vo muito alm da nostalgia, e remete a imagens ancestrais que nos ligam nacionalmente enquanto brasileiros e, em sentido amplo, enquanto gnero humano. isso que percebemos em nossa Mitocrtica.

 

 

Primeiros passos

 

Nos estudos do mito importante ter como ponto de partida dois elementos distintos: o reconhecimento da narrativa cannica e a identificao do nome verdadeiro que o mito assume. Nomear conhecer. So esses elementos que sero tensionados pela mitocrtica – por meio da identificao dos mitologemas e organizao de mitemas redundantes – para que enfim o mito ento se revele.

A narrativa cannica, como sugere Eunice Gomes, no um resumo de textos sobre o mito, mas aquilo que o sistematiza (GOMES, 2011). Seria algo como um modelo padro, um tipo ideal weberiano, que forma sua representao hegemnica. Esta imagem construda tendo por base no apenas o senso comum, mas tambm a influncia miditica, em um processo de retroalimentao no qual o texto cultural se torna mais coerente, menos arracional, e de mais fcil compartilhamento.

No caso do mito do saci, o cnone fala de um moleque negrinho, de uma perna s, que pratica todo o tipo de diabruras, mas sem nunca ser verdadeiramente mal. O saci carrega por vezes um cachimbo, veste carapua vermelha – a fonte dos seus poderes mgicos – e se desloca por meio de um redemoinho. Interessante notar que falar de saci , imediatamente, falar em modos de sua captura. Mesmo hoje a grande atividade escolar de celebrao do folclore costuma ser uma caa ao saci.

O Stio do Picapau Amarelo, srie infantil escrita por Lobato entre 1920 e 1947 – e que contou com inmeras adaptaes audiovisuais – institucionalizou um desses mtodos: o uso da peneira para cont-lo e o roubo da carapua para desempoder-lo. Aquele que toma a carapua do saci ganha poder sobre ele, e, tendo-o preso, pode chantage-lo para que realize os desejos de seu captor. A fora dele est na carapua, como a fora de Sanso estava nos cabelos. Quem consegue tomar e esconder a carapua de um saci fica por toda vida senhor de um pequeno escravo (LOBATO, 2005, p. 18, grifo nosso).

Com o tempo, a narrativa cannica vai sofrendo tamanho influxo cultural que pode paulatinamente se afastar dos mitologemas originais, perdendo mitemas em um processo de esvaziamento e desbastamento. No nvel mximo da estereotipia, temos apenas a casca do mito, um nome que nada mais diz, uma imagtica sem lastro de sentido. Num momento anterior a este, quando apenas um mitema valorado enquanto os demais so suprimidos, diz-se que o mito sofreu heresia – termo usado em seu sentido etimolgico, como a escolha de uma nica viso (DURAND, 2010, p. 144).

A fora da mdia na construo desta narrativa cannica desbastada se mostra quando o prprio lastro da adaptao original vai se perdendo nos vrios nveis de massificao da mensagem. Monteiro Lobato evidentemente se inspirou no material colhido em seu Inqurito para compor sua verso literria do Saci no Picapau Amarelo, publicado trs anos depois. Ainda assim, precisou fazer escolhas. Na obra infantil, o saci tem costume de chupar sangue dos cavalos. Traz as mos furadas como duendes portugueses e carrega ainda muito de demonaco, marcadamente pelo temor a objetos religiosos e ao cheiro de enxofre. Nas subsequentes adaptaes televisivas, o duende brasileiro perdeu muito de sua referncia religiosa, deixou o cachimbo de lado, foi destitudo do furo nas mos e tornou-se mais moleque do que diabrete.

Por vezes, um mito est mobilizando mitemas to distintos – ou ordenados em constelaes to diferentes – que pode carregar falsamente um nome, enquanto escamoteia outro (DURAND, 1998, p. 247). No Inqurito encontramos uma srie de variaes alm do tradicional Perer, atribudas a onomatopeias do canto de pssaros: Saci Ceper, Saci Cerer, Saci Trique, Saci Siriri, Saci Serumperer, Saci Perereca, Saci Sater, Saci Mofera, Saci Saper, Saci Sader, Saci Patar, Saci Sia-Teresa.

Lobato (2008), todavia, aceita mais a sugesto de Manequinho Lopes: viria do Tupi aa cy perereg, olho mau saltitante, mas salienta que a etimologia no ficou comprovada. O nome, no caso, indicaria que o duende possui olhos doentes e, portanto, sempre vermelhos. Curioso perceber que a viso, sempre ligada percepo e a capacidade de discernir falha nesta interpretao do saci, fazendo com que as fronteiras entre certo e errado no fossem facilmente distinguveis para ele.

A miopia, por outro lado, tambm prejudica a agncia. Algo que no percebemos na etimologia proposta por Teodoro Sampaio. Negrinho irrequieto e malfico, tendo um dos olhos doente (a-y) e outro muito vivo e bulioso (a-perer) (SAMPAIO, 1901, p. 311.) Diferente do Perer de Lopes, o Saperer carregaria em si a dualidade do olho bom e do mau. Como as lnguas indgenas so baseadas na oralidade, no na escrita, isso quer dizer que o texto escrito exige forma fixa, enquanto o oral permite que os vrios entendimentos coexistam ao mesmo tempo e na mesma histria.

H ainda outra sugesto de origem autctone: derivao do mito Guarani do Yasy Yater que, conforme Juan Ambrosetti, significa fragmento da lua. No a lua romntica e acalentadora, mas masculina, enganosa e sedutora. Os primeiros registros tanto de Saci, quanto de Yasy so contemporneos; datam da segunda metade do sculo XIX. Impossvel afirmar com certeza qual mito antecedeu o outro, ainda que o consenso indique a origem indgena. No entanto, apesar da proximidade dos nomes, o processo de derivao – com supresso de mitemas e acrscimo de outros – gerou mitos completamente distintos. Ambrosetti (1894, p. 135), ao descrever o mito do Yater, o faz com os seguintes termos:

Um ano loiro, bonito, que anda coberto por um sombreiro de palha e levando um basto de ouro em sua mo. Seu ofcio o de roubar os meninos de colo, que leva para o monte, lambe, brinca com eles e logo os abandona envoltos em trepadeiras. [...]. No falta quem assegure que ele rouba tambm as mulheres bonitas, que so igualmente abandonadas, e que o filho que nasce desta unio, com o tempo, tambm ser um Yasy Yater.

            No se pode ignorar que o duende Guarani ser descrito como loiro rende, de imediato, o qualificativo de bonito, enquanto a feiura frequentemente atribuda ao saci. Neste relato, em especfico, no se fala da cor de sua pele; mas frequentemente descrita como plida feito o satlite terrestre. J no prprio Inqurito, beleza um atributo mencionado apenas uma vez quando atribuda ao saci, enquanto que feio ou horrvel – de maneira explcita e implcita – so recorrentes. No depoimento 59 temos um exemplo desta feiura para o informante: cara quadrada de preto velho, nariz chato, olhos vermelhos e embriagados, orelhas enormes, lbios grossos, boca torta de fumante (LOBATO, 2008, p. 298). So as mobilizaes do mitologema do Escravo – onde constelam imagens ligadas raa, captura, servido forada quando a carapua tomada.

Em um trabalho pioneiro, Renato Queiroz comparou todos os adjetivos e qualificadores ligados ao saci no texto fonte organizado por Lobato com uma pesquisa de campo que desenvolveu no interior de So Paulo cerca de 70 anos aps a publicao do Inqurito. Levanta com isso o argumento para sua crtica introdutria: o Inqurito, enquanto campanha organizada por um veculo de imprensa, oferece um recorte elitista dos depoimentos. Para ele, o mito se ajustava perfeitamente aos interesses ideolgicos de setores da classe dirigente da poca no sentido de discriminar simultaneamente negros e caipiras. As referncias ao Saci e suas aes reproduziriam a maior parte dos esteretipos depreciativos com os quais so definidos os negros na sociedade brasileira. A prpria falta de perna indicaria essa deficincia como mais um elemento de desaforo (QUEIROZ, 1987, p. 70).

Por outro lado, em seu trabalho de campo que buscava um recorte caipira, Queiroz encontra variaes que julga considerveis nas descries do mito. O duende continua negro, mas menos demonaco e animalesco. E no contm qualquer referncia ao fartum peculiar aos negros e muito menos ao odor de enxofre, que tanto incomodavam os olfatos sensveis dos informantes de Monteiro Lobato (QUEIROZ, 1987, p. 75).

O antroplogo se questiona como foi possvel que um diabrete preto, perneta e migrante rural acolhesse tanta simpatia em uma sociedade to profundamente marcada pelo preconceito racial, seguidora de princpios cristos e vida pela urbanizao (QUEIROZ, 1995, p. 142). Para ele, a resposta foi uma paulatina domesticao do saci, que se tornou mais moleque, perdendo traos assustadores e diablicos, num processo que exploramos ao refletir sobre a narrativa cannica. Em seu raciocnio, entre imagens de bandido, malandro e bufo, o saci continua refletindo o mesmo lugar destinado aos negros nas narrativas. A dignidade e respeitabilidade permaneceriam, assim, exclusivas aos brancos (QUEIROZ, 1995, p. 147).

Outro ponto de interesse na pesquisa de Queiroz est na forma como sugere a relao do mito do saci com a populao negra. Esta ligao se daria fundamentalmente por uma perspectiva utilitarista. Presume ele que os escravos tivessem grande interesse em manipular a figura do moleque travesso, atribuindo s suas peraltagens uma srie de ocorrncias – pequenos furtos, quebra de utenslios etc. – pelas quais, no fosse o Saci, acabariam sendo mais seriamente responsabilizados e punidos (QUEIROZ, 1987, p. 92).

A anlise materialista de Queiroz certamente vlida, mas cabem ressalvas. Primeiramente, por ignorar o valor simblico das narrativas, como se as aes concretas estivessem descoladas de uma movimentao do mito no imaginrio – ou como se o imaginrio no tivesse consequncias concretas. Para alm disso, esteve ausente tambm na sua leitura o fato de que o mito no esttico, mas dinmico. Ao analisar qualquer mito dcadas aps um primeiro estudo, a degradao ou incorporao de mitemas inerente ao objeto. Quem se domesticou foi o saci ou a sociedade? O racismo no desapareceu, claro, mas escamoteia seu rosto.

Vale apontar: o depoimento que abre o Inqurito assinado por uma mulher de famlia negra e proletria, que incorpora no texto referncias raciais que hoje percebemos racistas (LOBATO, 2008, p. 41). Em diversos depoimentos, os depoentes entrevistam informantes de classes pobres, vrios negros, e incorporam o relato em linguagem direta, mimetizando a oralidade e a prosdia dos informantes. E mesmo esse grupo atribui descries recorrentes no que diz respeito ao mito: feiura, fedor, aparncia animalesca, etc. Um exemplo ilustrador de uma realidade da poca: o racismo no era um pecado da elite que assinava o Estado, mas uma condio de tal maneira imbricada no pensamento que emergia em todas as instncias do social, nas cincias, na elite branca e no proletariado negro.

O racismo d forma ao registro, mas ser que tambm afeta os mitologemas, as estruturas que fundamentam o mito? No seria essa uma reduo ao mitologema do Escravo? Veremos a seguir.

 

 

A mitocrtica

 

Na investigao dos relatos do Inqurito, relacionamos os seguintes mitologemas: o Indgena, o Pssaro, o Demnio, o Heri, o Transgressor e o j abordado Escravo. A referncia ao saci indgena, cuja origem Tupi-Guarani exploramos acima, aparece no texto apenas nos textos introdutrios escritos por Lobato ou nos introitos de Manequinho Lopes, ambas tentativas de racionalizar o mito. Entretanto, encontramos alguns entrecruzamentos espaados com os mitemas evocados pelo Yasy: em especial o do Sequestro e da Seduo. O depoimento 10 o nico que fala de um saci mais sexualizado, tentador de moas, mas sem referncias a gravidez (LOBATO, 2008, p. 75). Por outro lado, os verbos atrair, sumir e arrastar para o mato repetem-se ao longo do texto, sendo aquele que sofre a ao um grupo de crianas, animais e, em uma nica meno, as crioulas (LOBATO, 2008, p. 354). Atravessamentos entre Saci e Yasy se mostram claramente no depoimento 53, em que o duende descrito como negro, mas com cabelos cor de ouro e portando um pedao de pau.

No mitologema do Pssaro, encontramos a fora da origem ornitloga. Oito depoimentos falam sobre o saci se transformar em pssaro, numa forma frequentemente ligada tristeza e melancolia, a um castigo ou ao envelhecimento. Ao observar os sons atribudos ao saci, curioso perceber que, com exceo do depoimento 70, o cantar do pssaro sempre descrito como lamentoso, transmitindo toda sua dor, enquanto o assovio do duende, em nove das dez vezes em que mencionado, descrito como zombeteiro, estridente e desafiador.

            Enquanto o saci ave chora de tristeza, o saci Transgressor diverte-se s gargalhadas e assovios. Mais do que um bufo, um profanador, e concentra aes vinculadas ao rompimento de proibies e de interditos. Seu habitat so as encruzilhadas, ou as estradas que percorre sempre nos horrios de transio – tabus frequentes no imaginrio popular. Saci circula s desoras, nas horas mortas ou nas horas de ave Maria[18], alm de perseguir quem trabalha em dias santos. O rompimento da interdio sua norma, mas tambm sua maldio. filho de Jabiru com mulher que casa trs vezes ou afilhado de mulher separada (depoimento 24) – reflexo das imagens que um casamento desquitado gerava sobre a figura feminina. Gluto, devora canjica rapidamente apenas para regurgit-la na panela dos homens (LOBATO, 2008, p. 235). Beberro incorrigvel, seca as adegas de vinho e depois as preenche novamente com urina (LOBATO, 2008, p. 43). Uma mobilizao tpica do arqutipo do Trickster.

Para Queiroz, o trickster assume muitas vezes o papel do bobo da corte. Um personagem a quem institudo o direito de romper a norma, quebrando aparncias e ultrapassando barreiras que ningum da sociedade ousaria cruzar. Entretanto, por meio desse processo catrtico que o trickster representa, a ordem seria na verdade reforada. E ainda com o mrito de revelar aos seus integrantes a desordem que poderia se instaurar caso as normas, os cdigos e os interditos viessem a se dissolver (QUEIROZ, 1991, p. 98). Seria este o caso do saci?

John Roberts, em um livro dedicado a compreender a distino entre o trickster divino dos nativos africanos para o trickster profano dos negros da dispora, indica que o trajeto antropolgico do contexto da escravido gerou transformaes na forma como o arqutipo mobilizado (ROBERTS, 1993). Sua chave de leitura a escassez: na frica, escassos eram os recursos, fazendo que ali se proliferassem histrias em que a astcia era o caminho para atingir a sobrevivncia e a bonana. J nos Estados Unidos escravagista, a falta era de liberdade. A astcia, ento, era a arma para resistir opresso. Nesse contexto, o trickster assumiria um outro papel arquetpico para as populaes em restrio de liberdade: o de Heri.

Quatro vezes o saci chamado de heri pelos depoentes, sendo um deles o Heri das capoeiras – no sentido de matas (LOBATO, 2008, p. 274) e em outro como o Heri da sexta-feira, indicando a relao com os perodos de transio (LOBATO, 2008, p. 348). Mas isso pouco diz. Quando olhamos para as funes estabelecidas pelo saci nas narrativas do Inqurito, percebemos uma relao bem mais complexa. Saci o guardio dos segredos, o protetor da Flor de Samambaia – capaz de realizar o desejo de quem a encontrar (LOBATO, 2008, p. 250). ainda um doador de riquezas, um ente que auxilia no casamento e na resoluo de causas perdidas com muito mais facilidade que os santos, ocupados demais com assuntos celestes (LOBATO, 2008, p. 295). Saci profano saci prximo, terrestre, capaz de agir por ns.

            especialmente exemplar o relato em que uma ex-mucama relembra quando era obrigada a fazer cafun na cabea de sua ama enquanto esta rezava o tero. Acarinhada na cabea, a mulher acabava sempre dormindo no meio do processo, e a escrava era obrigada a aguardar que ela acordasse para continuar velando sua orao. Certa vez, em meio a um cochilo, a ama foi visitada em sonho por um saci que pregou nela uma solene bofetada. Desde ento, conta, a mulher nunca mais dormiu no tero. Tempos depois, a negra assumiu: o saci foi essa mo que est aqui! (LOBATO, 2008, p. 187). Respiros de liberdade em um contexto de restrio, soprados pelos ventos de mudana do duende.

O imaginrio da noite faz concentrar no saci vrios elementos que transparecem no Inqurito: orelhas de morcego; olhos como dos bichos noturnos; dentes pontiagudos e unhas enormes como fera. Em algumas verses, seu p termina em uma garra de corvo, recuperando o aspecto da ave de mau agouro. Em outras, ps, chifres e barbas de bode faro eco aos demnios europeus. Por outro lado, no apenas aos seres da noite que o saci comparado. Os leitores descrevem o saci como sendo esperto como caxinguel, mais rpido que veado, e com viso mais precisa que da coruja. So metforas comparativas, claro, no descries fsicas, mas com isso percebemos traos positivos tambm presentes no relato.

A peneira, que na narrativa cannica se tornou o grande objeto da captura do saci, quase no mencionada no Inqurito. Quem faz as vezes de artefato um rosrio bento – tanto de contas quanto um improvisado, feito de capim. A peneira s captura se for de cruzeta, ou seja, se trouxer uma cruz segurando as tramas da palha. Enfim, percebemos, o que capaz de tirar a liberdade do saci no nada alm do componente religioso.

            Essa averso, que mobiliza o mitologema do Demnio, traz contradies curiosas. Vrios relatos o descrevem como filho do demnio, parente do diabo, alcoviteiro do demnio ou como satans regenerado. No entanto, igualmente comum dizer que o mito incapaz de qualquer maldade grande. Mais ainda, um dos depoimentos mais conhecidas diz que o saci era um demnio que fugiu do inferno e que recebeu do prprio Deus uma carapua capaz de torn-lo invisvel para que possa continuar mantendo distncia das hostes infernais (LOBATO, 2008, p. 129). O fato inquieta um depoente, que manifesta: Como dindinha conciliava sua f catlica e suas relaes com o capetinha? (LOBATO, 2008, p. 295).

Ocorre que o caboclo sempre teve uma relao dual com o demnio na narrativa oral. Era este o grande pai da maldade, mas era ao mesmo tempo um inimigo trgico cuja derrota sempre estava assinalada. H todo um ciclo de histrias do Diabo Logrado na literatura oral (CASCUDO, 2012). O demnio, pai da mentira e senhor da astcia, acabava enganado pelo heri. Era o povo que atestava assim sua prpria capacidade e inteligncia – desde que, claro, conhecedor da tradio.

 

 

Consideraes finais

 

Ao reintegrar os mitemas que circundam o mito do saci, percebemos que, nos termos de Gilbert Durand, a anlise feita por Renato Queiroz leva o mito heresia. Amputa-o no da perna, mas de todos os outros mitemas que no os ligados negritude e escravido. O saci descrito no livro como feio, insidioso, bestial, mas tambm como inteligente, veloz, amigo, protetor. Amaldioado e aparentado do demnio, tambm abenoado pelo altssimo. Castiga os negros, mas tambm os vinga. Com sua magia, capaz de invadir qualquer buraco de fechadura, imune s regras. Rompe suas correntes e a dos que enxergam nele imagens de seus prprios anseios de libertao.

Quando a luta difcil, disfara-se de pssaro e vai chorar suas dores nas brenhas. Mas logo volta, recupera o riso e faz ecoar bem alto seu deboche aos poderosos. Quem pode derrot-lo somente o povo, dotado de astcia e tradio. Ainda assim, ele sempre volta.

Elemento importante tambm a perna que falta. Nunca descrita como deficincia, mas como peculiaridade. Verbos ligados ao saltar, pular, correr so dos mais populares aos ligados ao saci. O nico p gera uma relao de homologia com o redemoinho e o furaco, que tambm tocam o solo em um nico ponto. Sua ausncia tambm seu poder.

Cascudo (2012) nos lembra que a carapua do saci smbolo de liberdade no Ocidente desde a Roma antiga, quando o pilu vermelho – artefato sagrado da deusa Libertas – era oferecido aos escravos que ganhavam libertao. Tempos depois, o objeto seria apropriado pelos grandes movimentos libertrios, como a Revoluo Francesa e a Guerra Civil Americana. No entanto, muito antes disso, os duendes, gnomos e trasgos j vestiam o gorro encarnado. So, afinal, livres enquanto foras da natureza. No por acaso que para escravizar um saci preciso tomar sua carapua. Sua grande fonte de magia a liberdade.

Por que o saci permanece atual? Por que ainda hoje comunica com tantos brasileiros? Ora, os poderes estabelecidos podem ser outros, mas as dinmicas de dominao e subordinao permanecem evidentes. As classes proletrias e os grupos negros e marginalizados continuam merc de uma elite cientificista, economicista e racista. Os ventos que o saci comanda sopram hoje por todo o Brasil. ele, afinal, este heri trapaceiro que chora por ns, mas tambm sabe rir. Que rompe com o estabelecido e que pode at trazer o caos, mas com a certeza de que com ele tambm vem a mudana.

 

 

Referncias

 

AMBROSETTI, Juan B. Materiales para el estudio del folk-lore misionero. Revista del Jardin Zoologico, 1894.

 

CASCUDO, Lus da Cmara. Dicionrio do Folclore Brasileiro. 12. ed. So Paulo: Global, 2012.

 

CORREIO PAULISTANO. Tradies Populares de Minas e S. Paulo. So Paulo, 22 set. 1859, p. 2-3. Disponvel em http://memoria.bn.br/pdf/090972/per090972_1859_01034.pdf. Acesso em: 25 fev. 2020.

 

DURAND, Gilbert. As estruturas antropolgicas do imaginrio: introduo arquetipologia geral. 4. ed. So Paulo, Martins Fontes, 2012.

 

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HABIB, Paula. Eis o mundo encantado que Monteiro Lobato criou: raa, eugenia e nao. 175f. Dissertao (mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Filosofia e Ciencias Humanas, Campinas, SP. 2003.

 

LOBATO, Monteiro. O Saci-Perer - Resultado de um inqurito. So Paulo: Globo, 2008.

_________. O Saci. So Paulo: Brasiliense, 2005.

 

O ESTADO DE S. PAULO. Histrias de caador – Um novo concurso do Estadinho. O Estado de S. Paulo, So Paulo, 6 mar. 1918. p. 6.

 

QUEIROZ, Renato. Um mito bem brasileiro: estudo antropolgico sobre o Saci. So Paulo: Polis, 1987.

 

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______. Migrao e metamorfose de um mito brasileiro: o saci, trickster da cultura caipira.  Revista do Instituto de Estudos Brasileiros. SP, n. 38, p. 141-148, 1995.

 

ROBERTS, John W. From trickster to badman - The black folk hero in slavery and freedom. Philadelphia: University of Pennsylvania Press, 1993.

 

SAMPAIO, Teodoro. O Tupi na Geographia Nacional. So Paulo: Typ. da Casa Eclectica, 1901.

 

 

[Recebido: 30 dez 2020 – Aceito: 18 mar 2021]



[15] Doutor em Comunicao e Informao pela UFRGS, mestre em Jornalismo pela UFSC. Pesquisador de ps-doutorado da UNEB. Contato: andriolli_costa@hotmail.com.

 

[16] Cidade da regio metropolitana de So Paulo de onde veio o barro.

[17] Quem sugere a etimologia a Lobato Manequinho Lopes, possivelmente influencia por O Tupi na Geografia Nacional, de Theodoro Sampaio, cuja segunda edio foi lanada em 1914.

[18] Conforme a tradio portuguesa, o arcanjo apareceu para Nossa Senhora s 18h. Por isso sempre nesse horrio o sino soava e os trabalhos eram interrompidos.