VOZES DE MARACANGALHA: INTERSECO DE SABERES E AFETOS

 

 

VOICES OF MARACANGALHA: INTERSECTION OF KNOWLEDGE AND AFFECT

 

 

Railda Maria da Cruz dos Santos[54]

https://orcid.org/0000-0002-3151-689X

 

Edil Silva Costa[55]

https://orcid.org/0000-0002-3151-689X

 

 

Resumo: Apresenta-se brevemente a produo potica tradicional de Maracangalha, povoado de So Sebastio do Pass, Bahia, a partir do repertrio da manifestao cultural Lindro Amor. As cantigas analisadas foram registradas no caderno de anotaes Cultura popular, da professora Nvea, moradora da localidade. Partimos do pressuposto que a dinmica dessa produo, ao longo do tempo, coloca nesse territrio os corpos de mulheres negras que, com suas vozes, interseccionam saberes, fazeres e afetos, de si e de seus pares, como dispositivo de (re)existncia. Para tanto, o artigo se ampara no mtodo qualitativo de cunho etnogrfico e nos tericos: Foucault (1996), Guattari e Rolnik (1986), Kilomba (2019), Quijano (2005) e Zumthor (1993, 2005, 2007, 2010). Alm do repertrio do caderno, trataremos tambm das narrativas de mulheres que integram o grupo de cultura popular supracitado. Por fim, tecemos consideraes acerca dos caminhos trilhados por essas mulheres para o deslizamento e permanncia da potica da voz nos dias atuais.

Palavras-chave: Maracangalha. Lindro Amor. Poticas orais. Cultura popular. Mulheres negras.

 

Abstract: The traditional poetic production of Maracangalha, a village in So Sebastio do Pass, Bahia, is briefly presented, based on the repertoire of the cultural event Lindro Amor. The songs analyzed were noted down by a local teacher, known as Pr Nvea and recorded in a notebook named by her as Popular Culture. We start from the assumption that the dynamics of this production, over time, places in this territory the bodies of black women who, with their voices, intersect knowledge, actions and affections, of themselves and their peers, as a device of (re)existence. To this end, the article is based on the qualitative method of ethnographic nature and the theorists: Foucault (1996), Guattari (1986), Kilomba (2019), Quijano (2005) and Zumthor (1993, 2005, 2007, 2010). In addition to the repertoire of the section, we will also deal with the narratives of women who are part of the aforementioned popular culture group. Finally, we make considerations about the paths taken by these women for the sliding and permanence of the poetics of the voice today.

Keywords: Maracangalha. Lindro Amor. Oral poetics. Popular culture. Black women.

 

 

O Lindro Amor de Maracangalha

 

Eu vou pra Maracangalha, eu vou
Eu vou de uniforme branco, eu vou
Eu vou de chapu de palha, eu vou
Eu vou convidar Anlia, eu vou...

(Caymmi, 1978)

 

A voz corrobora a existncia de um coletivo, de uma ao poltica, de uma cultura. Nesse sentido, a voz exerce no meio humano uma funo forte, mas no idntica (ZUMTHOR, 2005, p. 80), uma vez que se corporaliza, de acordo com o sujeito de enunciao, rompendo e remodelando-se no tempo e no espao. a partir dessa premissa que pensamos no texto da cultura popular, mais especificamente, a poesia oral de grupos subalternizados que criam sua linguagem singular como mecanismo de insurgir contra o sistema hegemnico. Assim, da linguagem das minorias que emanam as reflexes deste artigo, das narrativas e dos cantos tradicionais que fizeram e fazem parte da cultura popular da comunidade de Maracangalha.

O nome do lugar conhecido pela cano de Dorival Caymmi. Decidido, o eu lrico iria para l com Anlia, se ela quisesse ir, seno ele iria s. Mas, o que nem todos que ouvem a cano sabem onde fica Maracangalha e porque ele queria tanto ir l. Vamos atender ao aceno dele, aceitando seu convite para nos aproximarmos desse lugar, com o ouvido atento s vozes de seus moradores.

Maracangalha um distrito do municpio de So Sebastio do Pass, cidade do interior da Bahia, cerca de sessenta quilmetros de Salvador[56]. Fazendo parte da regio do Recncavo, o ncleo urbano de So Sebastio do Pass bastante antigo: foi uma freguesia criada em 1718, sendo distrito de So Francisco do Conde at 1926, quando foi emancipada e promovida a cidade. A partir da dcada de 1960, desenvolve-se graas explorao de poos de petrleo e, embora rica, tem uma das populaes mais pobres do Estado e ndices de desenvolvimento humano muito baixos.

Com uma populao negra predominante, em funo do processo de ocupao da rea ainda no sculo XVIII e da necessidade de mo de obra escravizada para a lavoura de cana-de-acar, a cultura local preserva fortes traos desse caldeamento. Compreendemos que nesse processo de criao h um dinamismo histrico, cultural e temporal, que possibilita novos modos de configurao e ressignificao do texto tradicional oral na atualidade. Nosso olhar se voltar mais especificamente para as mulheres negras e sua produo cultural nos dias de hoje. Desse modo, focaremos nos modos de produzir de mulheres que interseccionam saberes, dizeres e afetos, e seus corpos como territrio de (re)existncia da voz potica nessa localidade.

Nos limites deste artigo, destacamos a manifestao cultural denominada Lindro Amor. De acordo com informaes locais, trata-se de uma brincadeira presente em Maracangalha desde o perodo dos engenhos que l existiam, estendendo-se pelo processo de industrializao da cana-de-acar pela Usina Cinco Rios e sendo recriada por moradores da vila atualmente. Segundo Pr Nvea – como conhecida a professora Nvea –, uma das mulheres integrantes do grupo Lindro Amor, o cortejo saa nos dias de feira e nos dias de pagamento dos trabalhadores da usina para arrecadar fundos, mas tambm com objetivo de simplesmente brincar ou festejar a vida. Assim ela explica:

O Lindro Amor um festejo, um cortejo formado por mulheres, homens e crianas, [...] que pediam ajuda para o caruru de So Cosme, So Roque e Santa Brbara. Ento, vinha na frente uma caixinha toda enfeitada de flores com a imagem do santo, as mulheres danando e os homens tocando e cantando o ritmo de afox. O cortejo saa na rua de casa em casa, pedindo oferenda ao dono da casa [...]. Um cortejo nascido de dentro dos terreiros de candombl que aqui existiam, surge da necessidade de angariar fundos para fazer e dar as oferendas para os orixs [...]. Alm disso, o Lindro Amor participava do ritual da botada da usina, ou seja, quando a usina ia comear a funcionar, moer a cana (Pr Nvea, informao verbal, 31/07/2019).

Como percebemos no depoimento acima, h inicialmente uma motivao financeira. O peditrio sempre foi costume nas irmandades e nos terreiros de candombl. Nasce da necessidade para angariar fundos, mas tambm uma forma de envolver a comunidade nas celebraes, tornando a festa uma promoo coletiva. O peditrio pode ser individual como, por exemplo, por parte do iniciado no candombl que no tem recursos para bancar a feitura do santo ou a festa para o seu orix. Nesse caso, o sujeito pede de porta em porta a ajuda necessria, em nome do santo. Em geral, usam as indumentrias de sua condio e hierarquia, portam balaios com imagens, pipocas ou a comida do orix e pedem dinheiro ou outro tipo de ajuda. Esse costume, menos frequente nos dias atuais, tambm serve como exerccio de humildade para o filho de santo, assim como para tornar pblica sua condio de iniciado. As irmandades costumavam pedir esmolas para obter recursos destinados ajuda humanitria para os mais necessitados, mas tambm para as festas dos santos de sua consagrao.

Na descrio de Pr Nvea, o balaio substitudo por uma caixinha toda enfeitada de flores com a imagem do santo e a ajuda seria para o caruru de So Cosme, So Roque ou Santa Brbara, santos catlicos, mas que tm estreita relao com as casas de santo no Recncavo da Bahia. Pedir ajuda para oferecer comida (o caruru) justifica-se porque, nesse contexto, o banquete deve servir a toda comunidade. No existe festa sem comida, sem fartura e sem compartilhamento. Oferece-se a comida do santo, mas esta deve ser tambm compartida com os envolvidos e assim se exerce a devoo.

A msica e a dana, do jeito que so apontadas por ela, nos remetem para a sada do terreiro para a rua: as mulheres danando e os homens tocando e cantando o ritmo de afox. Afox um ritmo do terreiro, uma evocao ou chamamento para o santo. Tocar e danar na rua o ijex, ou seja, o ritmo de afox tambm tornar pblica a relao do cortejo com os terreiros. Curiosa a estratgia de colocar o cortejo na rua coincidindo com o dia do pagamento dos trabalhadores e dias de feira, porque nessas ocasies haveria mais dinheiro circulando e, portanto, seria mais vantajoso para alcanar o objetivo. Com o passar dos anos, o cortejo ganha caractersticas mais de folguedo ou festejo e a funo de peditrio vai se esvaziando. Da surge a questo: quais as funes que assume hoje? O que leva esses sujeitos a reinventarem essa tradio e como ela se configura na contemporaneidade? Qual o papel das mulheres nesse contexto?

Assim, procuramos compreender o Lindro Amor, suas motivaes de criao e permanncia, enquanto texto que produz sentidos para a comunidade de Maracangalha e para as mulheres, demarcando seus territrios de identidades e produo de subjetividades. Flix Guattari, em Subjetividade e histria, ao abordar sobre produo subjetiva, traz para seu debate o termo singularizao como forma de recusa produo subjetiva capitalstica. Para o autor, essa singularizao seria como dispositivos, vias de escape para que grupos sociais, as minorias, criem seus prprios modos de referenciao, suas prprias cartografias (GUATTARI; ROLNIK, 1986, p. 49). Assim, propomos pensar a produo potica de Maracangalha como um processo singular em que a subjetividade ocorre emprestando, associando, aglomerando dimenses de diferentes espcies (GUATTARI; ROLNIK, 1986, p. 37). Nesse sentido, processo de singularizao relaciona-se com processo criativo, ligaes, resistncia, troca de saberes, de afetos, mas tambm com a produo potica.

A nossa anlise ancora-se nos estudos culturais, a partir de uma viso interdisciplinar, aliada a um referencial terico que dialoga com a proposta referida, alm das narrativas apresentadas e materiais (orais/virtuais ou impressos/materiais) recolhidos da tradio oral da comunidade. Isso porque consideramos as mulheres integrantes do Lindro Amor enquanto arquivos vivos (COSTA, 2016) e suas narrativas reveladoras de prticas de armazenamento, conservao e catalogao de saberes.

Osmar Moreira Santos, na obra Arquivos, testemunhos e pobreza no Brasil, aborda que, para alm de seu corpo e performance, caixas de sapatos, bas, gavetas entre outros, podem constituir-se em arquivos de pobres como lugar de resistncia (SANTOS, 2016, p. 16). Assim, os relatos, mas tambm colees de objetos, documentos e cadernos de anotaes, podem ser vistos como arquivos[57] da cultura de tradio popular dessa comunidade. Enquanto resistncia, os arquivos podem significar a labuta do trabalho, a criao e recriao da cultura oral, mas tambm resistncia aos embates culturais no interior de um coletivo.

Diante desta silepse, pensar as poticas orais tambm analisar os sentidos, as formas de resistncia e ressignificaes para a comunidade e para as pessoas que faziam e fazem parte desses grupos. Portanto, a partir da apresentao e breve anlise do Lindro Amor, propomos refletir sobre os territrios da voz, os corpos de mulheres negras e a interseco de saberes e de afetos em sua produo cultural.

 

 

Delineando o territrio da voz em corpos de mulheres negras

 

Conhecida por sua hospitalidade, poeticidade e musicalidade, Maracangalha tambm lembrada por narrativas orais sobre personagens famosos neste cenrio, como a histria da sambadeira Amlia[58] e do capoeirista Besouro[59]. Algumas dessas narrativas remontam ao tempo dos engenhos, quando grupos afrodescendentes eram escravizados e explorados pelo sistema de poder.

Como foi dito, Maracangalha pertence ao municpio de So Sebastio do Pass, a 51 Km do cruzamento das rodovias BR-324 e BR-110. No acesso vila, h um monumento, uma espcie de chamin, que representa partes da usina e identifica o nome da comunidade. Apresenta uma paisagem natural e modificada, marcada pelos canaviais, pelas guas do Rio Joanes e por um solo denominado massap, elementos esses que se fundem no processo de construo de sua linguagem potica.

Portanto, ao chegar comunidade, nos deparamos com uma encruzilhada, que pode ser descrita, percebida e visualizada em suas formas, mas tambm em sentidos. Na horizontal, temos uma linha frrea que nos leva para outros contextos e cenas culturais. J no sentido vertical, trilha-se para o centro da comunidade. importante ressaltar que nesse cruzamento, avistamos, esquerda, as runas da Usina Cinco Rios. Seu nome gasto pela ao do tempo, representa a decadncia de uma atividade econmica que permanece na lembrana dos mais velhos.

Nesse territrio cultural, h uma praa nomeada Dorival Caymmi que, em seus contornos, revela traos especficos do local como o desenho de um violo, signo que compe e faz parte da cultura popular tradicional da localidade. Em volta da praa, casas arquitetadas na poca em que os moinhos da usina estavam a todo vapor, a Igreja Nossa Senhora da Guia, alm do largo do mercado, que serviu e serve de palco para as festas populares da comunidade. Maracangalha era toda festa e oraes, como descreve Valdevino Neves Paiva:

O largo da capela parecia uma lapinha. Barracas de palha de pindoba ou dendezeiro, enfeitadas de bandeirolas multicores, eram o principal ponto de atrao turstica das pessoas vindas das fazendas vizinhas, da cidade de So Sebastio do Pass e de outras, como Candeias, So Francisco do Conde, Santo Amaro, Salvador entre outras. [...]. Por toda parte o povo andava, e em toda parte havia um ponto de diverso: aqui uma roda de samba; [...] adiante uma roda de capoeira com capoeiristas famosos da Bahia, como Mestre Bimba e outros; mais frente – cavaleiros trajados a rigor, cavalos enfeitados [...]. Ngo bebo no faltava, perturbando as rodas de samba, intrometendo-se entre os folies do afox organizado por Lau (Ladislau Bispo) na fazenda Quibaca, ou entre os blocos que Jos Porfrio ou Z Pretinho colocavam nas ruas (PAIVA, 1996, p. 67).

A saborosa descrio de Paiva nos d a dimenso de quo colorida e fervilhante era Maracangalha em dias de festa, envolvendo pessoas advindas de outras cidades, num conjunto que misturava religiosidade, cavalgadas, samba e capoeira, tudo regado a muita bebida e podendo haver confuso. nesse territrio que analisaremos as produes poticas dos moradores de Maracangalha, reconhecendo a contribuio dessas produes para a formao identitria baiana e brasileira. O lugar potico, onde mulheres negras trocam saberes para que a memria da tradio atravesse o tempo e o espao.

Embora o Lindro Amor no seja uma manifestao cultural exclusivamente feminina, nossa pretenso aqui apresentar um breve olhar sobre o deslizamento dos corpos das mulheres negras que fazem parte da cultura de tradio oral de Maracangalha. Quem so essas mulheres? O que seus corpos produzem?

Tentando traar um perfil das narradoras maracangalhenses, observamos que elas so senhoras de 60 a 80 anos, em grande parte no escolarizadas ou semianalfabetas, praticantes do cristianismo e de religio de matriz africana. Historicamente, as mulheres negras da regio eram trabalhadoras dos engenhos, das casas grandes, amas de leite, rezadeiras e sambadeiras. Atualmente, seus afazeres vo alm dos de donas de casa. Exercem atividades representativas em sua comunidade, como mes de santo, costureiras, professoras, lderes de grupo cultural, entre outras ocupaes. Mulheres de classes populares que, por intermdio de suas memrias, transportam, mas tambm conectam passado e presente, percebendo ou no, que suas aes resultam na atualizao e conservao da potica oral.

Para o medievalista Paul Zumthor, o corpo ao mesmo tempo o ponto de partida, o ponto de origem e o referente do discurso (ZUMTHOR, 2007, p. 77). De acordo com o pensamento do autor, o corpo o local que emana a voz. Nele, a voz se materializa, dando uma impresso de presena, impondo-se, preenchendo espao, tanto material quanto semntico. Enquanto territrio vocal, o corpo presena performtica. J a voz precisa do corpo para atingir sua plenitude (ZUMTHOR, 2005). Portanto, o corpo das mulheres negras deve ser visto como o espao territorial da voz potica tradicional de Maracangalha, que se articula em um trnsito semntico discursivo para sua (re)existncia.

Grada Kilomba, ao discorrer sobre os corpos de mulheres negras, afirma que No racismo, corpos negros so construdos como corpos imprprios, como corpos que esto fora do lugar, por essa razo corpos que no podem pertencer (KILOMBA, 2019, p. 56). A afirmao da autora pontua, mas tambm valida o longo processo histrico vivido pelas mulheres negras inseridas no sistema racista, opressor e patriarcal, que invalidam seus corpos e, automaticamente, todos seus conhecimentos. Ao nos referirmos s mulheres negras, seus corpos no podem ser vistos como primitivos ou irracionais, como foi conceituado na perspectiva eurocntrica para as relaes de dominao e explorao de trabalho (QUIJANO, 2005). Entretanto, aqui, o corpo tem uma integridade, uma racionalidade, ele produz linguagem. o corpo um territrio em que ganha vida a performance potica. Ele carrega a memria cultural, mas tambm a voz da tradio. Desse modo, interessa-nos investigar a atuao das mulheres de Maracangalha enquanto corpos que resistem e enfrentam e revertem os discursos que as desqualificam.

 

 

Entre a oralidade e a escrita, extenses da memria

 

Adentrar a comunidade de Maracangalha, enquanto pesquisadoras, vasculhar, com o olhar minucioso, as gavetas, bas e quartinhos, procura de objetos, indumentrias, bandeiras, cadernos, livros, instrumentos musicais, CDs, DVDs etc. Compem o cenrio investigado, altares, imagens de So Cosme e Damio, do Sagrado Corao de Jesus e Maria, Santo Antnio, quadros que representam outras paisagens culturais. Interessa-nos a poesia oral/escrita, o canto, as narrativas em performances, entrelaando discursos do ontem e do agora, mas tambm todo esse cenrio e os objetos que o compem. Esse conjunto integra a produo da cultura local, revelando as formas de arquivamento da memria, individual e coletiva.

Todo arquivo uma seleo e parte de uma ao, valor, significao que determinado objeto representa para um indivduo ou seu grupo, pois desde a seleo para essa guarda, de forma intencional ou no, o ato de arquivar os objetos, carregam em si a memria de seu guardio. Os arquivos da cultura popular esto distantes dos arquivos pblicos, dos grandes centros culturais, das instituies que representam o Estado, mas tambm so formas de salvaguardar e preservar a memria cultural, seus fazeres, suas crenas, seus costumes, da ao do tempo. Ademais, percebemos que os sujeitos tambm selecionam seu arquivo material com formas prprias de organicidade e metodologia, cuja diversidade se faz presente nos arquivos pblicos, mas com cuidado e zelo, pelo valor simblico que esses arquivos representam para os indivduos e para a comunidade. Portanto, metodologia e organicidade perpassam por um ato subjetivo dos sujeitos.

Alm disso, os arquivos trazem em si o vazio, o silncio, o rastro de outros tempos, experincias e vivncias. Assim, vemos que podem servir de testemunhos de lembranas e esquecimentos, assim como so tambm ferramentas para a preservao de informaes culturais relacionadas ao grupo do Lindro Amor. Destacamos dentre os objetos de fixao de memrias um dos cadernos da professora Nvea.

Para a leitura dos signos presentes no acervo cultural do Lindro Amor, apropriamo-nos da expresso arquivista anarquista proposta por Reinaldo Marques que, ao fazer referncia ao perfil do pesquisador ao lidar com o arquivo literrio, deve atuar como arquivista anarquista, lendo o arquivo a contrapelo (MARQUES, 2008, p. 117). Segundo o autor, isso possibilita uma leitura crtica, a desconstruo da ordem dos arquivos, formulando novas formas de leituras e interpretaes. O sujeito do arquivo desafia o arquivista, pois o fora a olhar para o que ocultado e acurar o ouvido para ouvir os silenciamentos.

O pesquisador/ouvinte, em contato com as formas de arquivos, deve voltar seu olhar para a natureza discursiva, sua ocultao ou exposio [...], mas tambm para a narrativa que se estabelece nesses fragmentos (COSTA, 2016, p. 60). Nesse sentido, vemos que o pesquisador deve atentar para a linguagem presentes nos objetos, os sentidos revelados pelo arquivo. Desse modo, considerando os narradores como arquivos vivos (COSTA, 2016), a construo de sentidos da potica oral se atualiza, se ressignifica, apresentando a intervocalidade que, segundo Paul Zumthor (1993), deve ser entendida como a voz que faz uma trilha no tempo e no espao, mas que tambm carrega a tradio.

Importante notar que, embora a transmisso dos saberes seja predominantemente oral, encontramos no caderno de anotaes um suporte valioso que indica no s o domnio do cdigo escrito, mas o uso adequado dessa ferramenta em funo do desejo de registro e salvaguarda. Zumthor (2010, p. 39) prescreveu que a poesia oral hoje se exerce em contato com o universo da escrita. Para o autor, esse contato pode acontecer em um prazo mais ou menos longo, chamando a ateno para o impacto da escrita sobre a poesia oral. A declarao de Zumthor apresenta relao com as formas de arquivo da cultura popular de Maracangalha, uma vez que os arquivos carregam a voz da tradio. Ao acessar esses arquivos virtuais/materiais, seus narradores/ouvintes, atravs da performance, proporcionam a produo e a transmisso da potica oral. Por outro lado, o caderno de anotaes, como o de Pr Nvea, revela a transcrio da voz, materializando a palavra oral em escritura, uma espcie de segunda lngua (Zumthor, 2005), afirmando o domnio do cdigo escrito em um territrio aparentemente dominado pela oralidade. Pode-se tambm revelar, numa perspectiva espacial, um territrio afetivo em que pares trocam afetos e experincias.

Dentre as mulheres que tem o domnio da escrita no grupo Lindro Amor, Pr Nvea tem as melhores condies para registrar no caderno – que intitulou Cultura Popular – aspectos essenciais do Lindro Amor, mas no s. Trata-se de uma relevante produo sobre a cultura de tradio oral, uma espcie de cdice, onde esto registradas as narrativas orais que atravessaram e atravessam o tempo na vila. A autora configura esse arquivo em duas partes: na primeira esto escritos cnticos, benditos e louvores em honra a Maria, So Roque e Santo Antnio; na segunda parte, encontramos as cantigas de Bumba-meu-boi, Folia de Reis, Samba de roda, bailados e do Lindro Amor. Nesse breve sumrio do caderno, esto listados os interesses da autora/organizadora e os textos caractersticos da tradio da comunidade que vo de textos religiosos a folguedos.

Nvea afirma que o caderno tem funo pedaggica dentro da comunidade, servindo de manual para as professoras ensinarem a cultura de tradio oral aos alunos da escola de ensino fundamental presente na vila, objetivando as apresentaes dos eventos escolares e a comemorao do dia do folclore, alm de servir de guia para as novenas dos santos catlicos e da festa da padroeira – Nossa Senhora da Guia. Assim, o caderno Cultura popular uma produo individual, uma escrita de si, que apresenta os saberes de uma coletividade, mas tambm, assim como a voz, se move para atender os mltiplos letramentos[60] da comunidade.

A cantiga do Lindro Amor que segue faz parte desse arquivo:

Eu no sou daqui,

Sou de Maracangalha.

Eu no sou daqui,

Sou da terra de Anlia.

Trago o samba no p

E o meu chapu de palha.

O sujeito potico dessa cantiga demarca um lugar e sua identidade cultural. O sujeito que fala est em outro espao que no Maracangalha, mas sente necessidade de demarcar seu territrio de identidade, valendo-se dos signos conhecidos do lugar em outros contextos. Desterritorializa-se e reterritorializa-se, autoafirmando-se. Para isso, empreende um movimento de apropriao ou antropofagia cultural da cano de Dorival Caymmi, como uma forma de dar maior visibilidade ao grupo, uma vez que o nome da localidade conhecido nacionalmente graas aos versos desse compositor. Ademais, chamam a ateno os signos presentes no texto de Caymmi: Anlia, chapu de palha e samba no p. Fazendo referncia a Amlia, segundo os moradores, a maior sambadeira de Maracangalha e por isso mesmo citada por Caymmi, o sujeito se coloca no mesmo lugar que deu fama ao povoado. A referncia ao chapu de palha, repetindo a mesma rima usada por Caymmi (Anlia/palha) uma clara aluso ao acessrio do grupo de samba que, por sua vez, imita as indumentrias dos trabalhadores dos canaviais e outras labutas.

Ao dizer eu no sou daqui, o sujeito potico coloca-se no lugar do estranho ou forasteiro em relao ao territrio-no-lugar ou um aqui ocupado provisoriamente. Por outro lado, coloca-se como algum que sabe bem qual lugar o seu e o vai descrevendo nos versos seguintes, no com caractersticas da paisagem, da localizao ou atividade econmica, selecionando aspectos culturais. Descreve o seu lugar como a terra da Anlia, e isso lhe basta. Assim como lhe basta descrever a si mesmo como algum que sabe sambar e usa chapu de palha. Com esses signos, cria-se uma imagem homognea que identifica o sujeito potico e todos os outros sujeitos da terra de Anlia.

O primeiro e o terceiro versos, eu no sou daqui, tambm nos remetem a uma cano de domnio pblico: Marinheiro s, gravada por Clementina de Jesus[61]:

Eu no sou daqui, marinheiro s

Eu no tenho amor, marinheiro s

Eu sou da Bahia, marinheiro s

De So Salvador, marinheiro s.

Assim como nos versos do Lindro Amor se diz textualmente sou de Maracangalha, aqui tambm necessrio dizer de onde se , demarcar seu territrio: eu sou da Bahia/de So Salvador. Nos versos do marinheiro fica subentendido que um sujeito em trnsito, um viajante solitrio (marinheiro s); nos versos do Lindro Amor, esse trnsito pode se justificar pelo fato de o cortejo tambm se deslocar para outras localidades para pedir a esmola dos santos, de acordo com a explicao de Pr Nvea mencionada anteriormente. Eis um aspecto que se constitui como forte indicador de identidade: o sujeito gira o mundo, mas se revela a partir do seu lugar de origem: no se diz eu sou..., mas se diz eu sou de.... Nos versos de ambas as cantigas parece transpirar um certo orgulho ao revelar seu territrio e tambm a necessidade de demarcar o deslocamento, explicitado nos versos eu no sou daqui.

A cantiga Marinheiro s ficou marcada pela interpretao nica de dona Clementina de Jesus, dona de uma voz negra que nos remete ancestralidade e aos cnticos dos terreiros, ela mesma pioneira em gravar pontos de macumba e dar visibilidade ao matriarcado nas religies de matriz africana. Ao dizer eu no sou daqui, essa voz nos diz tambm desse lugar diasprico e solitrio. Se consideramos que a Marinha do Brasil foi um dos poucos lugares a acolher os negros libertos no perodo ps-abolio, em funo das pssimas condies de trabalho e da forma desumana como os trabalhadores eram tratados, haver ainda muito a se dizer dessa cantiga[62]. No entanto, no caber aqui, pois nos desvia do repertrio do Lindro Amor e das anotaes de Pr Nvea.

Em outra folha do caderno, encontramos a cantiga de samba de roda que segue:

Arraste a cadeira e senta, mulher!

Tu no dana, tu no samba,

que diabo faz em p?

Arraste a cadeira e senta, mulher.

Como se v nessa quadra, o contexto de interlocuo a roda de samba. O sujeito potico revela um incmodo pelo fato de a mulher estar de p, sem danar. Na roda, o lugar do corpo danante o centro. Em volta da roda esto os msicos e os cantadores, os que no danam e se limitam a responder os refres e bater palmas. A mulher em geral ocupa o centro, o lugar da dana, assim como o sapateado e a umbigada. Nesse espao central, espera-se o corpo livre, comandado apenas pelo ritmo da msica. No entanto, nessa cantiga, podemos observar que no h liberdade de escolha. O corpo feminino que, apesar de estar de p, no ocupa o lugar da brincadeira, convidado a sentar-se, ou seja, excludo da roda. O tom imperativo arraste a cadeira e senta no deixa opo nem meio-termo: ou est dentro ou est fora (ou dana ou senta). A estrutura circular da cantiga, comeando e terminando com versos idnticos (a ordem de se sentar) deixa clara a insistncia nessa ideia: nos versos centrais est a explicao (Tu no dana, tudo no samba) e a indignao (que diabo faz em p?), reforando o incmodo com a repetio que inicia e fecha a estrofe (arraste a cadeira e senta).

Essa mulher parece no ter voz nem escolha, devendo assumir o papel j previamente determinado. Poderia parecer uma preocupao motivada pela gentileza de dar assento a uma dama, no fosse o tom grosseiro da pergunta que diabo faz em p? Como se essa posio da mulher de p atrapalhasse o samba, ocupando o lugar de quem deveria danar. Nessa situao, ela excluda da roda, invisibilizada, sendo colocada como mera observadora. Por outro lado, a ordem de se sentar pode ser interpretada tambm como uma provocao para que todas as mulheres participem do samba. Os versos dizem claramente qual o lugar que a mulher deve ocupar e, se no o fizer, comete um interdito que se traduz no incmodo e na irritao do sujeito potico. Em ltima instncia, seu corpo ocupa o seu lugar de estar no mundo e, se esse lugar ou seu comportamento visto como inadequado, porque ela faz uso da liberdade de desafiar o pr-estabelecido.

desse modo que essas cantigas se convertem como farto material etnogrfico, documentos da memria cultural que revelam os modos de ser e fazer das comunidades narrativas. No Lindro Amor, as vozes das mulheres da comunidade de Maracangalha so ressignificadas e traduzidas em discursos. Entende-se discurso como formas de expresso da linguagem que servem de ferramenta para essas mulheres se posicionarem contra hierarquias discursivas que tentam silenciar suas vozes e invalidar seus saberes. Desse modo, vamos ao encontro do pensamento de Foucault (1996) sobre interdio da fala de grupos subalternizados pelo sistema de poder. Segundo o autor, esses grupos at falam, mas existem mecanismos de poder que os impedem de serem ouvidos. Nesse sentido, o discurso dessas mulheres negras interditado por uma ordem discursiva que, no seu interior ou exterior, dita o que deve ser falado e por quem.

Desse modo, essas mulheres juntam esforos e criam parmetros para seus modos de produzir. Nos seus corpos, esto as engrenagens discursivas da produo potica e de sua coletividade, o lugar marginalizado pela cultura hegemnica, silenciado historicamente pelo discurso do poder, como nos alerta Kilomba (2019), ao argumentar que o silncio da subalterna tem suas razes no colonialismo. Nesse sentido, ao produzir e transmitir a potica oral, essas mulheres negras tentam romper essa barreira discursiva colonial, que nega seus conhecimentos e suas vozes. Por outro lado, o que observamos a existncia desse lugar e o eco de suas vozes atravessarem o tempo, mover-se em sua comunidade por intermdio de suas memrias. Nota-se que essas narradoras tm conscincia do que fazem e o porqu fazem, no havendo passividade em suas produes.

na linguagem e com a linguagem que essas mulheres e seus pares buscam o devir emancipatrio e poltico em suas vidas, tentando sair de um lugar comum. Os que a produzem de modo inconsciente ou no, criam uma lngua prpria que os caracterizam, construindo suas identidades. Esses so os aparatos que determinam o modo de produzir utilizado por essas pessoas, caracterizando um estilo prprio, possibilitando sair do padro de normalidade discursiva. Portanto, essas mulheres se apropriam da linguagem como dispositivo ou veculo para levar a memria do texto oral a novos interlocutores e outros contextos. E, nesse deslizamento, elas se afirmam enquanto mulheres negras, alm de descobrirem outras formas de ser mulher, insurgindo-se contra um sistema de poder.

A cena teatral, performtica, de transmisso dessa potica, evidencia o protagonismo dessas mulheres negras como os pilares fundamentais da produo, mas tambm a interseco de seus saberes e de seus corpos, alm dos seus esforos para valorizao e revitalizao do texto na atualidade. Assim, percebemos os modos de produo da poesia oral como o processo de singularizao que geram ligaes de resistncia, embates e fora criativa. Esses elementos possibilitam a produo, a transmisso desse fazer literrio, alm de categoriz-lo como uma produo de troca dos afetos e saberes.

 

 

Consideraes finais

 

As reflexes apresentadas neste artigo nos levam a pontuar os caminhos trilhados por mulheres para produzir a cultura popular de tradio oral. Analisamos que esses caminhos levam seus fazeres para um campo discursivo onde esto presentes embates internos e externos, aes polticas, relaes de fora, mas que tm como resultado a valorizao e salvaguarda do texto oral. Alm disso, a via mostra as engrenagens desse processo, medida que a produo acontece, a poesia oral se move para a atualizao e ressignificao.

Por outro lado, ressaltamos que elas, ao reinventarem o processo de produo, tambm se reinventam enquanto mulheres. Desse territrio de fala, com seus pares, buscam emancipao e ascenso social, vivenciam experincias que possibilitam insurgncia de prticas que desestabilizam, mas tambm modificam discursos sociais que servem de barreira para ascenso do grupo e de sua cultura.

Por fim, a produo da potica oral perpassa pela criao artstica, singularizao, criatividade da linguagem, mas tambm pela resistncia e (re)existncia da cultura popular de tradio. Nessa perspectiva, literatura e vida caminham juntas no campo de produo, como possibilidade, ferramenta, maquinaria de criao potica. Ademais, nessa linguagem e no entrelaar dos corpos dessas mulheres negras que, historicamente, seu texto produzido, transmitido e ressignificado no tempo. Vivendo e predominando nos registros e na memria cultural de Maracangalha.

 

 

Referncias

 

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MARQUES, Reinaldo. Memria literria arquivada. Aletria: Revista de Estudos de Literatura, Belo Horizonte, n.18, p.105-120, jul./dez, 2008.

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QUIJANO, Anbal. Colonialidade do poder, eurocentrismo e Amrica Latina. In. LANDER, Edgarbo (Org.). A colonialidade do saber: eurocentrismo e cincias sociais. Perspectivas latino-americanas. Colees Sur Sur. Buenos Aires: CLACSO, 2005, p.117-142.

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ZUMTHOR, Paul. Introduo poesia oral. Belo Horizonte: UFMG, 2010.

 

 

 

[Recebido: 11 out 2020   Aceito: 13 jan 2021]

 



[54] Possui graduao em Letras Vernculas pela Universidade Estadual de Feira de Santana/UEFS (2006), Especializao em Lngua Portuguesa e Literatura Brasileira pela Faculdade Catlica de Cincias Econmicas da Bahia/FACCEBA. Mestranda do Programa de Ps-graduao em Crtica Cultural (Ps Crtica/UNEB).

[55] Possui Graduao em Letras Vernculas (Universidade Federal da Bahia/1987), Mestrado em Letras e Lingustica (Universidade Federal da Bahia/1995) e Doutorado em Comunicao e Semitica (Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo/2005). Professora Titular Plena de Literatura Portuguesa da Universidade do Estado da Bahia, atuando como professora permanente no Programa de Ps-graduao em Crtica Cultural (Ps Crtica/UNEB). Integrou por diversas vezes a coordenao do GT de Literatura Oral e Popular da ANPOLL. Tem experincia na rea de Letras, com nfase em Literatura, pesquisando os seguintes temas: tradio oral, identidade cultural, literatura oral e conto popular.

[56] So Sebastio do Pass est situado na Regio Metropolitana de Salvador e fica distante 58 quilmetros da capital, a 37 metros de altitude. Segundo dados do IBGE de 2019, sua rea total de 538,32 km² e populao de 44.300 habitantes. O municpio possui quatro distritos: Nazar de Jacupe, Lamaro do Pass, Maracangalha e Banco de Areia.

[57] Entende-se por arquivo um conjunto de documentos produzidos e acumulados por uma entidade coletiva [ou individual], pblica ou privada, pessoa ou famlia, no desempenho de suas atividades, independentemente da natureza do suporte (SANTOS, 2016, p. 27).

[58] Faz-se referncia a Maria Amlia da Cruz (03/05/2011-16/02/1992), foi uma moradora e sambadeira, natural de Maracangalha. Era uma verdadeira e primorosa artista no s na arrancada como no sapateado perfeito, na caprichada rodada e na umbigada final (PAIVA, 1996, p. 26, grifo do autor). Segundo, Paiva e moradores da vila, Maria Amlia da Cruz Anlia, musa de Caymmi.

[59] Besouro descrito como um homem temido em toda regio por sua valentia e mandingas [...]. Capoeirista de primeira linha, puxador de samba [...] (PAIVA, 1996, p. 67).

[60] O significado do letramento varia atravs dos tempos e das culturas e dentro de uma mesma cultura. Por isso, prticas to diferentes, em contextos to diferenciados, so vistas como letramento, embora diferentemente valorizadas e designando a seus participantes poderes tambm diversos (ROJO, 2009, p. 99).

[61] A composio, de tradio oral, foi gravada por Clementina de Jesus no LP Marinheiro s. A cantiga , por vezes, atribuda a Caetano Veloso, que foi quem produziu o LP de Dona Clementina, lanado em 1973, assim como quem fez a adaptao da cantiga.

[62] Prova disso a Revolta da Chibata, rebelio de negros marinheiros em 1910. O que motivou o motim foi justamente o uso de chibatadas, aceito oficialmente, por oficiais brancos para punir marinheiros negros e mulatos.