telenovela, seja nas diversas plataformas multitelas, características da nova fase de circulação
de histórias na sociedade, ou, ainda, pela constituição dessa narrativa em se tornar um gênero
capaz de narrar os dilemas da sociedade brasileira e criar um repertório compartilhado no
cotidiano e na memória da sociedade.
É possível notar que, na conjuntura da multiplicidade, é necessário o surgimento de um
novo olhar crítico para se pensar nas especificidades suscitadas pelo meio, haja vista exigir
novas leituras a fim de que se dessacralizem formas arraigadas na academia de se conceber o
audiovisual. Desse modo, é importante recuperar o ponto de vista da crítica literária Ivete Walty
(2011), que, ao analisar as configurações do cenário cultural contemporâneo, assinala a
mobilidade como característica principal da sociedade moderna pensada sob uma perspectiva
cultural complexa, multifacetada, marcada pela convergência devido às conexões constantes
mantidas com outros artefatos culturais.
As considerações de Walty (2011) mostram-se profícuas, especialmente, por
fornecerem subsídios para tratar da relação imanente entre literatura e teledramaturgia, aqui
analisada ao largo de determinadas posturas acadêmicas excludentes. Seguindo essa linha de
raciocínio, a teleficção emerge dessa relação como um gênero de representação da cultura
nacional. Ancorada em uma estrutura que dialoga intensamente com os traços da cultura
popular, a narrativa televisual, especialmente a brasileira, apresenta personagens que se filiam
a arquétipos, que vêm sendo revitalizados no âmbito da cultura popular por centenas de anos,
especialmente pelo fato de representarem, por suas maestrias, a desforra contra o sistema.
Enquanto gênero de ficção seriada, a telenovela ou “folhetim eletrônico”, como muito
bem defende Campedelli (1987), apresenta em sua configuração uma longa tradição herdada
das narrativas orais. Assim, num jogo alusivo, pode-se perfeitamente compreender que os
milhões de telespectadores do gênero na contemporaneidade muito se assemelham aos
auditores dos jograis da Idade Média. Campedelli (1987) ainda esclarece sobre a narrativa
televisiva: “Não tão longa quanto o romance nem tão curta como o conto –, história usualmente
curta, ordenada e completa, de fatos fictícios verossímeis” (CAMPEDELLI, 1987, p. 18). Na
Idade Média, o termo novela era usado como sinônimo de “enredo” ou “narrativa trançada” e
era aplicado às novelas de cavalaria e, já naquele momento, tinha não só a função de entreter,
mas também de ditar regras e modelos de conduta.
Na telenovela, a história é longa e se desenrola, quase sempre, por mais de cem
capítulos, sete a oito meses (CAMPEDELLI, 1987). Calcada numa longa tradição milenar de
sincronização de linguagens, a telenovela emerge da experiência acumulada do folhetim, do