certa [...].” Observamos que as narrativas persistentes nas tekoás, igualmente, têm caráter de
aconselhamento aos jovens e de orientação sobre a organização da vida e do modo de ser
Guarani, mediante exemplos narrados pelos mais velhos. Essas experiências em que o
narrador narra um fato tem o intuito de estabelecer relações com o que ele viveu e com sua
capacidade de transmitir, designadamente, um ensinamento sobre a cultura ancestral Guarani.
Quanto aos conselhos e ensinamentos narrados nas coletividades: “[...] pedem que
todos respeitem as outras pessoas. Aconselham a ajudar cuidar dos idosos, [...].” Constata-se
que os conselhos dos mais velhos são muito importantes para os indígenas. Uma vez que
existe uma grande preocupação desses narradores mais velhos com relação ao respeito para
com as outras pessoas e com o cuidado para com as pessoas idosas, dado que estão
preocupados com o futuro dos indígenas e, por isso, aconselham os mais jovens e as crianças.
No fragmento: “[...] eu sou pai e quero muito que minha filha cresça no jeito de ser Guarani.
No momento em que ela entender as palavras, devo dar conselhos a ela. Tenho as
orientações guardadas, pois as recebi dos meus avós [...]”, verificamos que o narrador dessa
narrativa se preocupa com o futuro de sua filha e manifesta o desejo de que ela cresça sendo
aconselhada e conhecendo os valores de sua cultura, assim como ele, que também, recebeu as
orientações de seus avós, aconselhará sua filha como uma forma de continuidade da tradição.
Também, podemos observar que a partir do momento do entendimento das palavras, a criança
já deve ser orientada e aconselhada, ou seja, desde pequena, a criança estabelece a relação de
sentido e de orientação social e cultural por meio dos pais e avós.
A fim de apreender aspectos relacionados ao espaço-tempo e às características do
território tradicional Guarani, estabeleceremos algumas conexões possíveis a partir da
narrativa 02:
Meu nome em português é Joel Pereira, em guarani é Kuaray. Eu moro na
Aldeia de Mato Preto (Erebango/RS). Nós somos uma aldeia, onde moram
dezenove famílias, são todos guarani, são todos da mesma família. Eu vou
falar um pouco dessa importância do espaço guarani, para uma comunidade
guarani. A gente sempre está refletindo, que sem tekoa não existe teko. O
espaço para o guarani é muito importante, porque ali ele consegue construir
a vida do guarani, mostrando para as crianças, essas crianças vão ser o futuro
do povo guarani. Então, o espaço no passado não existia um espaço
delimitado. Não existia nenhum tipo de limite para o guarani viver. Hoje já
existe esses limites de espaços. Aí que prejudica, um pouco, a cultura. Esses
espaços são cercados, na maioria, pelas grandes cidades, pelas plantações de
soja. É onde existe a maior dificuldade, em se buscar, em viver esse tekoa.
Às vezes, as próprias crianças, a maioria sai fora, e trazem as coisas ruins
para dentro das aldeias. Então, por isso é importante que se tenha um espaço
para construir um bom tekoa, para continuar mostrando essa cultura que vem
desde o passado, desde os nossos avôs, que hoje está correndo risco, devido
aos pequenos espaços que se têm. Para se buscar onde tem espaço, para se
viver, construir o tekoa, é sempre através dos mais velhos. São os mais
velhos que lembram das histórias, que também, com certeza, através de
nhanderú. Na maioria das aldeias hoje tem o karaí, que é o rezador, aí ele
está sempre se comunicando com nhanderú. Ele sempre fala onde é o lugar
bom. Mesmo que o lugar for devastado, que não tem mais mata, que foi
devastado pelos colonos, mas ele acha que aquele lugar, quando for
construído o tekoa, ela pode voltar tudo aquilo que foi devastado. Por
exemplo, pode voltar a mata, pode voltar as nascentes de rio, os animais,
tudo isso ele prevê. Prevê através de histórias, de comunicação com
nhanderú. Para ter um espaço bom, um bom tekoá, onde as comunidades
possam viver o seu teko, precisa onde tenha uma boa mata, um bom rio,
nascentes e é isso. Para viver um bom teko precisa de tudo isso. E para ver