Revista do GT de Literatura Oral e Popular da ANPOLL – ISSN 1980-4504

MEMÓRIAS DO POVO TUPINAMBÁ: HISTÓRIAS SOBRE O CABOCLO MARCELINO



TUPINAMBA’S PEOPLES MEMORIES: STORIES ABOUT CABOCLO MARCELINO



Randra Kevelyn Barbosa Barros (UNEB)

Elizabeth Gonzaga de Lima (UNEB)



RESUMO: Os indígenas da nação Tupinambá de Olivença vivenciam muitas histórias de resistência que se mantêm vivas nas memórias dos mais velhos, sendo contadas oralmente pelos anciões no âmbito dessas comunidades. Algumas dessas narrativas foram registradas na obra Anciões em Contos e Encontros, organizada por Alessandra Mendes e Jaborandy Tupinambá. O livro apresenta um mosaico de narrativas de quatorze anciões, composto por relatos memorialísticos e contos tradicionais. Em suas histórias, muitos sábios relembram a figura do Caboclo Marcelino. Este nativo foi uma liderança indígena que reivindicou, durante o período da década de 1930, os direitos territoriais de sua comunidade, sendo por isso perseguido pela polícia local e visto como bandido pelos coronéis da região. Nessa época, as vozes dos nativos foram silenciadas, sendo necessário presentificá-las hoje, por meio da escrita, para que a história seja escovada a contrapelo, como propõe Benjamin (1985). Tomando como ponto de partida as histórias registradas em Anciões em Contos e Encontros, pretende-se analisar como os anciões retratam o Caboclo Marcelino em suas narrativas orais e a importância de rememorar esse personagem histórico para o povo Tupinambá. Por meio da análise dessas narrativas, busca-se ainda divulgar a relevância dessa liderança indígena para o fortalecimento da identidade Tupinambá.   

Palavras-chave: Povo Tupinambá. Memórias. Histórias. Caboclo Marcelino.



ABSTRACT: The indigenous peoples of the Tupinamba nation in Olivença experience many stories of resistance that remain alive in the memories of the elders, being told orally by the elders within these communities. Some of these narratives were recorded in the book “Anciões em Contos e Encontros”, organized by Alessandra Mendes and Jaborandy Tupinambá. The book presents a mosaic of narratives by fourteen elders, composed from memorialist accounts and traditional tales. In these stories, many sages remember the figure of Caboclo Marcelino. This native was an indigenous leader who claimed, during the 1930s, the territorial rights of his community, being therefore persecuted by the local police and seen as a villain by the colonels of the region. At that time, the natives voices were silenced, and it is necessary to present them today, through writing, so that history is brushed against the grain, as proposed by Benjamin (1985). At starting point the stories recorded in Anciões em Contos e Encontros, it intends to analyze how the elders portray Caboclo Marcellino in his oral narratives and the importance of recalling this historical character to Tupinamba peoples. By means of the analysis of these narratives, it is also sought to divulge the relevance of this indigenous leadership for the strengthening of the Tupinamba identity.

Key words: Tupinamba Peoples. Memories. Stories. Marcelino Caboclo.





O povo Tupinambá de Olivença: nação indígena baiana



Os Tupinambá1 de Olivença, segundo os estudos da antropóloga Susana Viegas (2018), publicados no verbete desse povo organizado pelo Instituto Socioambiental (ISA), encontram-se na região sul da Bahia, ocupando um espaço de Mata Atlântica, próximo a Ilhéus. Apesar de terem sido o povo que primeiramente sofreu com a colonização e exploração europeias, nunca abandonaram a sua condição de indígena ao longo da história, embora o poder hegemônico tenha negado essa identidade em vários momentos. Especialmente a partir do século XIX, o Estado retirou-lhes os direitos nativos por compreender que esses indígenas se assemelhavam mais a camponeses ou caboclos do que a povos originários de fato. Isso é decorrente de uma visão estereotipada a respeito dos filhos da terra, marcada pela desconsideração da indianidade2 daqueles que sofreram processo de miscigenação intenso. Nesse sentido, por muito tempo, os nativos da Bahia e outras regiões do Nordeste foram designados como caboclos, uma mistura entre indígena e branco, como uma forma de negar a existência das comunidades tradicionais nesse local. Assim, utilizava-se essa justificativa para desapropriar os povos originários de seu território.

Apenas a partir da Constituição de 1988, a solicitação dos Tupinambá de Olivença e de outras comunidades de se reconhecerem como indígenas foi ouvida, havendo uma garantia legislativa de seus direitos. Viegas (2018) aponta que esse povo foi reconhecido oficialmente como nativo pela Fundação Nacional do Índio (FUNAI) em 2001. Além disso, a primeira fase de demarcação de seu território que consiste na publicação dos relatórios de estudos de identificação e delimitação da terra foi concluída em 2009. Todavia as outras etapas ainda não foram realizadas, por isso não houve uma demarcação territorial de fato3.

Com o intuito de produzir um livro que mostrasse as histórias contadas pelos mais velhos dessa nação indígena baiana, Alessandra Martins Girotto Mendes propôs o projeto Anciões em Contos e Encontros à Secretaria de Cultura do Estado da Bahia, tendo sido aprovado e financiado pelo órgão governamental. Assim, em parceria com o indígena Jaborandy Tupinambá, as gravações das entrevistas na aldeia foram realizadas em 2012, e a obra publicada em 2014. O exemplar é dividido em duas partes: a primeira é composta por quatorze capítulos, um dedicado a cada ancião, havendo na abertura de cada seção uma foto e apresentação de cada sábio, seguidos de suas narrativas; a segunda é denominada “Adicional”, apresentando informações complementares (relato do organizador indígena, orações tradicionais e mapa da aldeia). Além disso, há um glossário ao final do livro.

Em seus relatos, a maior parte dos anciões conta as lutas de Marcelino José Alves, mencionado pela comunidade como Caboclo Marcelino, como sendo relevantes para a história desse povo. Os sábios demarcam a importância dessa liderança tanto para o passado, na época em que esse nativo atuou, quanto para o presente, visto que ele se tornou uma inspiração para os filhos da terra prosseguirem em suas reivindicações. Busca-se, então, analisar as imagens que os sábios Tupinambá apresentam desse indígena em suas narrativas na obra Anciões em Contos e Encontros.



Caboclo Marcelino: a criminalização de uma liderança nativa


Segundo Patrícia Couto (2012), desde o início do século XX, principalmente nos anos vinte e trinta, foi um período marcado pelo avanço da população não indígena sob o território de Olivença, buscando expulsar a comunidade nativa da região. Nesse contexto, entre 1929 e 1936, destaca-se o indígena Marcelino José Alves – conhecido como Caboclo Marcelino –, tendo repercussão a sua luta em defesa dos direitos territoriais de seu povo.

A elite cacaueira estava empenhada em construir uma ponte sob o rio Cururupe, que ligaria a comunidade de Olivença ao município de Ilhéus. Isso facilitaria o acesso de automóvel dos coronéis ao local ocupado pelos filhos da terra. Logo, essa construção transformaria o território indígena em espaço de veraneio, intimidando a permanência dos moradores na região. Como isso muito provavelmente acarretaria a expulsão dos nativos do local, Caboclo Marcelino liderou um grupo de indígenas para protestar pelo direito à terra, buscando impedir a edificação dessa ponte. Na comunidade, como mostram Carlos Santos e Katu Tupinambá (2012), ele era o único que sabia ler e escrever, por isso também fazia reinvindicações legais, organizando ainda mais o movimento nativo.

As lutas de Marcelino foram retratadas de maneira a criminalizar o indígena. A imprensa de Ilhéus dominada pelos fazendeiros começou a noticiar de maneira sensacionalista vários eventos que colocavam o nativo e os seus seguidores “como perturbadores da ordem pública, que estariam percorrendo a região, incendiando fazendas, destruindo plantações e instaurando o terror entre os pacatos moradores” (COUTO, 2003, p. 56). Vários delitos foram atribuídos a Marcelino, até mesmo o de assassinato. Nos periódicos, era comum também retratar essa liderança como se estivesse em uma categoria não humana, atribuindo-lhe a condição de selvagem:

Nos jornais, Marcelino foi definido como “caboclo” e “o homem que se fez bugre”, questionando-se sua condição de homem civilizado, mas ao mesmo tempo retirando dele qualquer laço coletivo ao nomeá-lo como “lampião” ou “criminoso” contrário aos interesses dos “índios mansos” e “caboclos decentes” (MEJÍA LARA, 2012, p. 48).

Como demonstra Mejía Lara (2012), era comum caracterizarem Marcelino como um bugre, pois assim aproximavam mais ele de um bicho do que de um homem. Sendo frequente ainda distinguirem-no do restante de sua comunidade, dado que os outros já eram considerados passivos, não se revoltando contra a expropriação.

As pressões conduzidas pelas notícias e também pelo processo aberto para investigar os delitos atribuídos ao Caboclo Marcelino mobilizavam ainda mais a atuação policial na busca pelo nativo para levá-lo à prisão. Diante de tanta perseguição, como apontam os estudos de Couto (2003, p. 63) realizados a partir dos registros oficiais, o indígena “foi submetido duas vezes a julgamento, em ambas tendo sido absolvido, o que provocou a ira dos poderosos locais que tinham por objetivo declarado o seu desaparecimento e dos adeptos”. Ainda assim, continuou sendo procurado, ocorrendo a sua última captura em 1936, na Serra do Padeiro, quando se entregou à polícia para evitar que houvesse mais repressão aos filhos da floresta, que estavam sendo obrigados a revelar onde a liderança estava escondida.

A definitiva prisão de Marcelino foi comemorada pela mídia, como mostra Carlos Santos e Katu Tupinambá (2012, p. 6), a manchete do Jornal do Estado da Bahia, de 6 de novembro de 1936, declarou “era uma vez, o Caboclo Marcelino”. Contudo, não se sabe o que de fato aconteceu com ele após a sua prisão. Existe a tese de que ele foi torturado e morreu em cativeiro. Mas não há uma confirmação exata de que isso aconteceu (COUTO, 2003). Embora tenham se mobilizado para primordialmente impedir a construção da ponte, Marcelino e seu grupo conseguiram apenas retardar a edificação, que acabou sendo construída e dificultando ainda mais a sobrevivência dos nativos na região.

O modo como essa liderança foi tratada mostra que no registro historiográfico apenas um ponto de vista é levado em consideração. Aqui, vale ressaltar as reflexões de Walter Benjamin (1985) sobre o fato de a escrita da história ser realizada, na maioria das vezes, atendendo a determinados interesses. Para o filósofo alemão, o historiador tradicional geralmente registra os acontecimentos tratando de um viés específico, dando destaque ao olhar dos vencedores. Assim, beneficiam-se os dominadores. No caso do povo Tupinambá, apenas a versão dos coronéis foi valorizada, retratando Marcelino como bandido, o que foi levado em consideração nos registros. Até porque, “os registros oficiais em geral expressam o ponto de vista oficial” (BURKE, 1992, p. 13), ignorando a visão daqueles que sofreram repressão.

Diante de toda essa perseguição e criminalização do Caboclo Marcelino, torna-se importante questionar como os nativos rememoram essa figura e a relevância dessa liderança para os Tupinambá de Olivença hoje. A pretensão de analisar esse ponto de vista se insere em um movimento de “escovar a história a contrapelo” (BENJAMIN, 1985, p. 223), desvelando as narrativas que foram ocultadas nos registros oficiais. Nesse sentido, é importante lembrar as estratégias levantadas por Peter Burke (1992) para que o historiador realize a sua tarefa de maneira mais justa. O estudioso ressalta que é necessário seguir as técnicas da heteroglossia e da micronarrativa. A primeira se caracteriza por considerar mais de um ponto de vista acerca de um acontecimento, praticando a multivocalidade. A segunda busca “a narração de uma história sobre as pessoas comuns no local em que estão instaladas” (BURKE, 1992, p. 341). Essas técnicas propostas por Burke (1992) podem ser aplicadas para se pensar outras narrativas acerca do Caboclo Marcelino sob a perspectiva dos mais velhos da comunidade. Essas histórias, tão presentes na memória dos sábios e transmitidas oralmente, são transcritas justamente para que não nativos tenham acesso a elas e para que se possa revisar a história oficial.


A revolta de Marcelino”: histórias de Anciões em Contos e Encontros


Anciões em contos e encontros, livro organizado por Alessandra Mendes e Jaborandy Tupinambá, tendo sido publicado em 2014 com o apoio financeiro da Secretaria de Cultura do Estado da Bahia, apresenta a compilação de narrativas de quatorze anciões Tupinambá de Olivença. Desse total, dez sábios – para falarem de si – mencionam a figura de Marcelino como um herói que lutou pelo povo indígena baiano. Há uma anciã que conheceu a liderança, tendo vivenciado essa época (Sra. Maria); alguns anciões ouviram histórias a respeito de Marcelino de seus avós (Sr. Domingão e Sr. Amaral); já outros, escutaram os seus pais falarem dessa figura histórica (Sr. Alicio e Sr. Manuel).

Sra. Maria (2014, p. 30), anciã de noventa e dois anos, narra que lembra de quando Marcelino foi preso (“eu o vi passar só de longe, mas como tinha muita gente olhando, eu nem cheguei perto”). Devido a sua idade, vivenciou a época de ascensão do coronelismo na região de Olivença. Quando o indígena foi preso na Serra dos Trempes, a anciã relata que todos na comunidade ficaram sabendo, visto que as notícias percorriam rapidamente a região na época, reflexo de ser uma cidade pequena. “Foi ele quem trouxe a informação que esta área o governo tinha que nos dar. E, por isso, jogaram um monte de crimes sobre ele e começaram a caçar ele. Esses crimes, dos quais ele era acusado, ninguém tinha prova” (MARIA, 2014, p. 30)4. A versão dessa senhora diverge das informações que foram amplamente divulgadas pela imprensa na época, pois ela pontua que houve um interesse por trás do processo de criminalização do nativo. Era uma forma de impedir que Marcelino continuasse atuando, explicando aos membros de sua comunidade os direitos que tinham sobre a terra e a legitimidade de reivindicá-los. A atuação do indígena incomodava especialmente aos coronéis, que desejavam continuar detendo o domínio de grande parte desse território.

Embora não houvesse provas, de tanto atribuírem crimes a Marcelino, Sra. Maria (2014, p. 30) reconhece que alguns nativos começaram a acreditar nesses delitos, mas explica que ela nunca acreditou nisso “porque sempre soube que os mais velhos eram sábios e eles protegiam muito Marcelino”. A anciã afirma que Marcelino era inteligente, conhecendo tanto o mato quanto a cidade:

Eu lembro que muito dos papéis que chegavam para algumas famílias assinar, era atrás de Marcelino que iam para resolver. Se ele não soubesse, ele conhecia alguém que sabia. Por isso o perseguiram e deram o sumiço nele, por causa de sua inteligência. Acredito que depois dele, nasceram outros Marcelinos. Infelizmente era uma época de muitas covardias contra nós, foi na época que o cacau começou a reinar na região. Esses novos "Marcelinos" não conseguiram aparecer, porque foram mortos. Nessa época muitos parentes eram assassinados e nós ou não ficávamos sabendo ou simplesmente ficávamos calados. Não podia fazer nada se não era fácil matar todo mundo e ninguém ficar sabendo (MARIA, 2014, p. 30).


Em virtude de saber ler, Marcelino até mesmo ajudava os outros nativos quando chegavam documentos na aldeia para eles assinarem, o que poderia ser papelada para transferir terras para fazendeiros. A narradora cita ainda outros Marcelinos, que surgiram depois e foram silenciados. Os nomes de muitos deles não são lembrados nos registros da história. A filósofa Jeanne Marie Gagnebin (2006) explica que cabe ao historiador a tarefa política de “transmitir o inenarrável, manter viva a memória dos sem-nome, ser fiel aos mortos que não puderam ser enterrados” (GAGNEBIN, 2006, p. 47). Entretanto, no caso dos Marcelinos da nação Tupinambá, parece que essa tarefa não foi cumprida. Os nativos que lutaram nessa época se tornaram os sem-nome esquecidos na historiografia, mas sempre lembrados pelo seu povo.

Sr. Domingão, liderança nativa, lembra que seus avós lhe contavam histórias sobre o Caboclo Marcelino. Ele afirma que tanto ele quanto o seu povo não desejam que a repressão se repita: “mas a gente não quer isso que aconteceu com o parente Caboclo Marcelino, que foi massacrado e torturado. Antes de Marcelino, teve também o coronel Nonato5 que tomava conta de Olivença” (DOMINGÃO, 2014, p. 16). Neste caso, lembrar de Marcelino, e também de Nonato, faz com que o narrador imediatamente pense em sua condição no presente, na possibilidade de ele e outros nativos enfrentarem a mesma perseguição que os guerreiros sofreram no passado. Para Gagnebin (2006, p. 47), outro papel do historiador é “lutar contra a repetição do horror (que, infelizmente, se reproduz constantemente)”. Essa reprodução ocorre principalmente porque as atrocidades cometidas no passado não foram punidas, não se fez justiça à luta de Caboclo Marcelino. Isso autoriza que outros casos semelhantes se presentifiquem na comunidade, pois parece que o poder público não se importa com o fato de a vida de diversos nativos estar em risco. Na verdade, essa ausência de preocupação com a causa indígena nota-se já no fato de não haver sido concluído o processo de demarcação territorial dos Tupinambá, o que propicia a continuidade de conflitos na região entre os filhos da terra e aqueles que desejam ser donos da terra.

Outro relato de Sr. Domingão (2014, p. 16) expõe o que muitos denominam “revolta de Marcelino”. Segundo o ancião, foi uma luta pelo território e para impedir a invasão de não indígenas nas terras da comunidade. Os policiais frequentemente entravam nas casas dos nativos procurando o foragido. “Mas toda vez que Marcelino sentia a presença deles ou os via, Marcelino corria pelo mato adentro” (DOMINGÃO, 2014, p. 16). Isso mostra que o nativo conhecia bem diversos lugares no mato onde pudesse se esconder. Apesar da coerção, os filhos da floresta não revelavam o paradeiro de Marcelino. Mesmo sofrendo torturas, eles continuavam em silêncio. Sr. Domingão narra que o nativo Duca Liberato foi torturado pelos policiais, mas – mesmo com isso – não falou onde o caboclo estava. Até mesmo a avó desse sábio foi perseguida, quando estava preparando comida para o foragido:


Nesse dia, ela estava cozinhando caranguejo para levar pra ele. Mas minha avó e Marcelino tinham um código, que era o assobio, para avisar que ela estava chegando e ele respondia se ela poderia subir, também com o assobio (DOMINGÃO, 2014, p. 17).


Os policiais interrogaram aos avós desse velho se aquele excesso de comida seria levado para o foragido. Apesar de ter negado, a avó foi forçada a levar os policiais para um lugar próximo de onde Marcelino estava e se utilizar do sistema do assobio para avisá-lo e assim ele conseguir fugir. Depois disso, Sr. Domingão relata que Marcelino se escondeu na Serra do Padeiro e, após algum tempo, decidiu se entregar para evitar que a perseguição ao seu povo continuasse. Essas narrativas ilustram como o indígena criminalizado era querido pelos membros daquela nação. Ele era tão considerado pelo povo que os nativos arriscavam a própria vida para protegê-lo. Embora muitos tenham sido torturados, outros acuados para revelar o paradeiro do foragido, os indígenas não revelavam onde a liderança estava escondida ou encontravam uma forma de avisá-la sobre a chegada dos policiais. Tudo isso para defender uma pessoa que muito ajudou a comunidade, que buscou garantir os direitos dos nativos Tupinambá.

O interessante das narrativas discutidas acima reside no fato de que elas foram transmitidas oralmente pelos avós do Sr. Domingão. E o próprio ancião afirma: “eu sempre contei nossas histórias que vivi e escutei de meus antepassados” (DOMINGÃO, 2014, p. 17). Essas histórias se fazem presentes na memória dos velhos. Daniel Munduruku (2012, p. 19) explica como a memória é transmitida nas comunidades tradicionais:


Sei que alguém pode querer saber como se dá esta transmissão da Memória no contexto da aldeia. Me adianto e logo vou explicando que é pela Palavra. A Tradição é passada pelo uso da Palavra. O “dono” dela é o ancião, o velho, o sábio. É ele que tem o poder e o dever da transmissão (MUNDURUKU, 2012, p. 19).


Diante da reflexão de Munduruku (2012), é possível pensar que a transmissão oral é tratada como uma forma de registro que impede a extinção das histórias dos povos originários. Cabe ao velho fazer uso dessa palavra oral para manter viva as narrativas que não estão escritas nos livros. Esse patrimônio não se perde porque “a história indígena é contada pelos velhos para os mais novos, de pai para filho, para não ser esquecida” (KAXINAWÁ, 1996, p. 6). Deste modo, como pontua Olívio Jekupé (2005), os sábios são vistos como se fossem as bibliotecas das aldeias.

Ong (1998) distingue oralidade primária e oralidade secundária. Para o estudioso, há culturas em que a oralidade é fundamental, pois são marcadas pela ausência do contato com a escrita (oralidade primária); e existem sociedades nas quais a oralidade se atualiza nos dispositivos eletrônicos, tendo a maior parte de suas atividades ligadas à escrita (oralidade secundária). Ainda discutindo essa questão, o pesquisador faz uma ressalva: “atualmente, a cultura oral primária, no sentido restrito, praticamente não existe, uma vez que todas as culturas têm conhecimento da escrita e sofreram alguns de seus efeitos” (ONG, 1998, p. 19). Então, as culturas orais primárias são aquelas que têm um pouco de interferência da escrita, mas toda a sua estrutura social é baseada na oralidade. Um elemento que se destaca nessas sociedades é o fato de que nelas “a experiência é intelectualizada mnemonicamente” (ONG, 1998, p. 46). Ou seja, a memória desempenha uma função extremamente importante porque é a partir dela que as histórias dessas sociedades serão narradas. Isso pode ser visto no relato do Sr. Amaral, membro do Conselho de Anciões, pois ele relembra Marcelino por meio do que ouviu de sua avó:

Aqui nós temos muitas histórias. Histórias de lutas e muitas histórias bonitas também. Minha avó contava muitas coisas. Certa vez, me contou que namorou caboclo Marcelino. Mas como ele era muito valente, minha bisavó proibiu o namoro (AMARAL, 2014, p. 26).


Nesse ponto, vale ressaltar que dentre as diversas histórias que o ancião lembra a narrativa sobre Marcelino é tida como indispensável para ser relatada. Circunstância que remete ao entrelaçamento entre memória individual e memória coletiva, pois segundo Maurice Halbwachs6 (2006, p. 51), “cada memória individual é um ponto de vista sobre a memória coletiva”. Dessa maneira, a figura do Caboclo Marcelino está na memória coletiva do povo Tupinambá e cada ancião tem o seu ponto de vista sobre essa figura, muitas vezes tendo formado esse olhar a partir das histórias que ouviu de seus antepassados, estando em consonância com a memória coletiva. A liderança marcou tanto a vida individual de cada nativo quanto a vida do grupo. Neste relato, observa-se uma história íntima. Não é lembrado o Caboclo Marcelino que ajudava os indígenas a ler as documentações, que lutava pela terra de seu povo e se utilizava de diversas estratégias para fugir das perseguições. Sr. Amaral guarda na memória a imagem do indígena como aquele que namorou com a sua avó, já que este fato lhe foi contado por essa anciã. Mesmo que seja um caso muito particular da avó do Sr. Amaral, não há como negar que essa lembrança, que está na memória individual, não se desvincula da ideia que o grupo tem dessa figura histórica, no caso, não se separa da memória coletiva. Assim, essas duas formas de rememorar estão em constante diálogo.

Lembro-me do caboclo Marcelino, que vivia correndo e se escondendo da polícia”. Assim Sr. Alicio (2014, p. 34), cacique com setenta e oito anos de idade7, inicia o seu relato. O velho narra que houve um tiroteio perto da Serra dos Trempes, mencionada como Serra do Padeiro na narrativa do Sr. Domingão, último lugar usado por Marcelino para se esconder. Após o confronto, nessa versão, Marcelino teria sido levado para Ilhéus, depois para Salvador e em seguida para o Rio de Janeiro: “Quando chegaram lá, nem sentença deram. De lá, ele sumiu. Ele foi morto, e sumiram com o corpo dele!” (ALICIO, 2014, p. 34). O narrador dá ênfase ao caráter arbitrário do tratamento dado à liderança. Na visão dele, quando o acusado chegou ao Rio de Janeiro, nem ao menos teve direito a um julgamento justo. Imediatamente, o filho da terra foi assassinado e nem mesmo o seu cadáver foi encontrado. E tudo isso Sr. Alicio (2014, p. 34) lembra porque o seu pai lhe contou e não porque vivenciou essas histórias diretamente: “eu que estou com 78 anos me alembro das histórias de Marcelino. Pai que andava com ele e me contava as histórias”. Ressalta-se aqui a dinâmica da tradição oral. Muito provavelmente o pai do Sr. Alicio já faleceu, mas este ancião ainda guarda na memória tudo o que ouviu, já que sua memória é constantemente exercitada tendo em vista a ausência do uso da escrita. O sábio é um idoso de setenta e oito anos que, ao falecer, não terá essas histórias extintas, tal como as narrativas do pai dele sobre Marcelino não se perderam no tempo. Como o seu pai, é provável que Sr. Alicio conte essas histórias ao seu filho, mantendo-as sempre presentes no seio de sua família e de sua comunidade.

Outro ancião que soube das histórias de Marcelino pelos seus pais foi o Sr. Manuel, falecido em 2013, mas contou as suas histórias para as outras gerações e também teve as suas narrativas registradas no livro em análise para que outras pessoas fora da aldeia tivessem acesso a elas:

Pode olhar o passado, tudo que aconteceu lá com Nonato, Marcelino, Duca Liberato e tantos outros. Seria muito difícil acontecer o que vem acontecendo hoje em dia, se não fosse o que é lembrado do passado, essa luta que está sendo travada é uma luta nossa, de todos os Tupinambás de Olivença. Nós temos que somar forças com as Lideranças para que nossa terra seja logo demarcada (MANUEL, 2014, p. 42).


O fragmento acima demonstra uma das características das culturas orais pensada por Ong (1998). Para ele, as sociedades orais são homeostáticas, ou seja: “elas vivem preponderantemente num presente que se mantém em equilíbrio ou homeostase, descartando-se de memórias que já não são relevantes para esse presente” (ONG, 1998, p. 58). Nota-se que Marcelino é citado ao lado de outros guerreiros Tupinambá porque lembrar deles é relevante para o presente desse povo. A luta pela demarcação das terras e a perseguição às lideranças indígenas é algo que se iniciou há muito tempo e os nativos ainda hoje persistem, continuam com suas reivindicações territoriais e resistindo ao extermínio. É preciso olhar para o passado e ver exemplos como de Marcelino, lembrar constantemente desse personagem histórico, como o fazem os sábios, na tentativa de recuperar aquela força e coragem do guerreiro Tupinambá.

Não é apenas os anciões que reiteradamente falam sobre Marcelino. Os jovens ouvem as histórias dos velhos sobre essa liderança. Esse é o caso de um dos organizadores do livro, Jaborandy Tupinambá, que na seção “Adicional”, expõe a sua visão sobre o assunto. Desde criança, sempre ouviu histórias a respeito de Marcelino, mas “os anciões contavam como se fosse só uma história e não algo que de fato tivesse acontecido” (TUPINAMBÁ, 2014, p. 66). As narrativas transmitidas oralmente pelos anciões podem dar a entender que são apenas ficção, porém os sábios recorrem à memória, mostrando outras formas de acessar a verdade. Isso instigou o jovem a procurar mais informações sobre o guerreiro nativo, notando que as ações dele precisavam ser relembradas para inspirar o movimento Tupinambá a continuar com as suas lutas. Para Mariana Souza (2014), a memória evoca referentes identitários importantes para um povo. É o caso de Marcelino para os Tupinambá. Ele é um símbolo de resistência para essa comunidade. Percebe-se que esse guerreiro, ao protestar contra a construção da ponte, ao exigir a garantia de que o território fosse habitado apenas por membros de sua aldeia, estava reivindicando o direito de ser nativo, de continuar praticando o seu modo de vida sem interferência dos não indígenas. Então, a memória, especialmente no caso dos povos originários, como pontua Munduruku (2012, p.18) “é quem comanda a resistência, pois nos lembra que não temos o direito de desistir, caso contrário não estaremos fazendo jus ao sacrifício de nossos primeiros pais”. O sacrifício de Marcelino incentiva os Tupinambá a lutarem para poderem continuar exercendo as suas indianidades, apesar de todas as repressões e práticas de extermínio.

O jovem nativo afirma que desde pequeno sempre foi chamado de caboclo e que, até mesmo os outros indígenas, assim se cumprimentavam. Jaborandy Tupinambá (2014, p. 66) afirma: “o que não imaginava é que essa foi mais uma estratégia de esconder nossa identidade”. Marcelino, na época em que atuou, foi tido como caboclo, negando-lhe a possibilidade de ser reconhecido como indígena. Mas, após a sua atuação, houve um sentimento de fortalecimento da identidade nativa, incentivando o povo a até mesmo buscar o nome da nação a que pertencia, se autodenominando e se reconhecendo enquanto Tupinambá de Olivença. A figura de Marcelino faz com que o sentimento de pertencimento à identidade Tupinambá se reforce, havendo uma transição de caboclos para indígenas, especificamente para nativos Tupinambá.

Desse modo, os anciões veem Marcelino como uma liderança que deixou sementes para os indígenas permanecerem lutando pela causa e afirmarem o seu direito de serem diferentes dos não nativos, reivindicando o direito originário à terra, que também é um direito à sobrevivência.


Considerações finais


Os olhares dos nativos contribuem para repensar a história, especialmente as injustiças que criminalizaram aqueles que lutaram pelos seus direitos, como é o caso do indígena Tupinambá Marcelino. Os relatos dos anciões, compilados no exemplar Anciões em contos e encontros, colaboram para reposicionar Marcelino José Alves na história, de bandido a ativista, pensando-o como liderança que lutou pelos direitos de seu povo.

O processo de revisionismo histórico é tão importante que, oitenta e dois anos depois do desaparecimento de Marcelino, no dia 20 de abril de 2018, houve um júri simulado em Ilhéus para possibilitar um julgamento justo ao nativo. Organizado pela Defensoria Pública, sendo parte da Série Júri Simulado – Releitura do Direito na História, nesse julgamento, o acusado foi absolvido de todos os crimes. Após o evento, houve uma mesa de discussão com lideranças nativas para discutir os direitos dos povos indígenas, mostrando que repensar o passado estimula a busca por atitudes que melhorem o presente.

Assim, as histórias – registradas nas memórias dos sábios Tupinambá e transmitidas oralmente – mantêm Marcelino vivo como um exemplo de resistência para as gerações passadas, atuais e futuras.


Referências


ALICIO. Caboclo Marcelino. In:_. MENDES, Alessandra; TUPINAMBÁ, Jaborandy (Orgs.). Anciões em Contos e Encontros. 1a Edição, Ilhéus, 2014. p. 34.


AMARAL. A igreja. In:_. MENDES, Alessandra; TUPINAMBÁ, Jaborandy (Orgs.). Anciões em Contos e Encontros. 1a Edição, Ilhéus, 2014. p. 26.


ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ANTROPOLOGIA. Convenção para a grafia de nomes tribais. Revista de Antropologia. Volume 2, São Paulo, 1954.


BENJAMIN, Walter. Sobre o conceito da História. In:_. Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e cultura. Trad. Sérgio Rouanet. 7 Ed. São Paulo: Brasiliense, 1985. (Obras escolhidas 1).

BURKE, Peter. A história dos acontecimentos e o renascimento da narrativa. In:_. BURKE, Peter (Org.). A escrita da história: novas perspectivas. Trad. Magda Soares. Editora da Universidade Estadual Paulista. São Paulo, 1992.


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[Recebido: 11 out. 2018 – Aceito: 16 abr. 2019]



1 A Associação Brasileira de Antropologia (ABA) determina que os nomes dos povos indígenas não sejam pluralizados, assim como devem ser grafados com a inicial em letra maiúscula.

2 Sentimento de pertencimento à identidade indígena.

3 O processo de demarcação das terras indígenas no Brasil consiste em nove etapas. O procedimento, em sua maior parte, é realizado pela FUNAI, havendo duas fases que cabem ao Ministro da Justiça e à Presidência da República, respectivamente (FUNAI, 2018).

4 A Sra Maria explica uma perspectiva interessante para se refletir sobre a imagem do Caboclo Marcelino. O indígena conseguia transitar entre a mata e a cidade. Com os conhecimentos adquiridos no espaço urbano, explicava ao seu povo sobre direitos territoriais indígenas que são omitidos pelo governo e pelos latifundiários.

5 Manoel Nonato do Amaral foi “um coronel mestiço nativo de Olivença-Ba. [...] Testemunhas da época o apontaram como o chefe político em Olivença, seja como coronel, seja como um índio. Moradores de Olivença relatam que ouviram falar que a casa de Manoel Nonato era um ponto de ‘acolhimento’ de índios e demais moradores” (OS BRASIS E SUAS MEMÓRIAS, 2020).

6O pensamento desse sociólogo demanda uma ressalva. Ele acredita que a memória e a tradição se extinguem, surgindo daí a necessidade do registro historiográfico. Isso não se aplica às sociedades indígenas, como foi explicado acima, ao tratar-se das reflexões de Munduruku (2012) e Jekupé (2005).

7 Não há uma uniformização quanto à revelação da idade dos anciões. A maior parte dos sábios não tem esse dado apresentado. Mas alguns acabam contando isso durante os seus relatos.

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BOITATÁ, Londrina, n. 27, jan.- jun. 2019